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O Espaço é Seu

O mercado precisa celebrar a história de Ronaldo Conde (Rafael Simi)

12.06.23

O mercado precisa celebrar a história de Ronaldo Conde.

A publicidade é um mundo de glamour relativo. Da mesma forma que ela te dá prêmios, champanhe, dinheiro e festas, pode te tirar do jogo sem aviso. Se a idade já pesa para todos em qualquer área de trabalho, a propaganda é ainda mais cruel. Na busca incessante pelo novo, basta não conhecer uma rede social criada anteontem, que você já começa a ganhar olhares tortos.

De todos os meus ídolos na propaganda, poucos continuam na ativa. Tive o prazer de trabalhar com alguns, como Ercílio Tranjan, João Livi e Renato Jardim. Mas a troca de guarda neste meio é implacável e até compreensível. O problema é o esquecimento. Ou não entender a dimensão dos que vieram antes de nós.

Houve um tempo em que o Clube de Criação se chamava Clube de Criação de São Paulo e o Rio de Janeiro era um lugar muito mais relevante. Fábio Fernandes e Nizan Guanaes passaram por lá. A MPM foi a maior agência do Brasil entre as décadas de 1970 e 1980 e seu escritório mais desejado era o carioca.

As superproduções de Hollywood (o cigarro, não o local), feitas pela DPZ, passavam pela sua linda cobertura em Ipanema, com vista para a praia e a Lagoa Rodrigo de Freitas. E a molecada desejava trabalhar em lugares como a Contemporânea, Salles, V&S e outras gigantes invadidas pela maresia da Praia do Flamengo.

Havia até uns lugares meio doidões, como a Doctor e a Comunicação Carioca, de onde saiu uma galera que está em altos cargos por aí, como Adriano Matos, Marcelo Felício, Ricardo Weitsmann e Rafael Pitanguy.

Foi neste caldo de cultura e criatividade que brilhou Ronaldo Conde. E a notinha sobre seu falecimento, apesar de respeitosa, não deu conta de celebrar o tamanho deste cara. Como criativo, ele passou, entre outras, por nada menos do que Almap e MPM. Foi presidente do Clube de Criação do Rio de Janeiro no início dos anos 1980, quando uma ditadura decadente e a importância do mercado do Rio exigiam um comando muito mais atuante e político.

Transformado em profissional de atendimento, Ronaldo trabalhou brevemente com Lula Vieira, uma figuraça, e fincou os pés na Propeg. Foi lá que o conheci. Estava organizando uma Semana de Publicidade na PUC-Rio, em 2000, e o convidei para palestrar. Por uma triste ironia, a palestra ocorreu num dia em que meu pai se recuperava de uma cirurgia no coração.

Na Propeg, depois batizada de Quê, ele conduziu a conta da Petrobras sob a gestão de dois governos diferentes: FHC e Lula. Duas formas distintas de pensar a empresa e ele administrava tudo. Para quem acha pouca coisa, devo lembrar que Fernando Henrique tentou até mudar o nome da estatal para Petrobrax. Não faltaram emoções.

Ronaldo fez filhos e amigos na mesma proporção. Minha mãe o conheceu como coordenadora de escola e amava seu jeito doce de falar. Em contrapartida, acho que ele gostava do meu jeito de escrever, pois me seguia em algumas redes e se engajava em alguns debates. Provavelmente, isso se devia mais ao seu gosto por bater papo do que a qualquer habilidade minha para atrair leitores. Era um homem querido muito antes de essa palavra se tornar um bordão um tanto banalizado. Ronaldo era querido de verdade e isso ficou comprovado após sua partida precoce.

Nos últimos anos de sua vida, cruzei muito com o Ronaldo tomando café no Shopping da Gávea. E via seu brilho continuar com o Marcelo. Hoje na Espanha, o Condinho foi o cara que me recebeu assim que me mudei para São Paulo, em 2010. Cheguei sem emprego. Só tinha uma pasta e muito medo. Me indicaram a ele porque sabiam que precisava mais de um cara generoso para me acolher do que um redator implacável que ficasse esculhambando minha pasta. Escolha certeira. Ninguém melhor do que um integrante da família Conde para cumprir esse papel de abraçar e dar carinho.

Rafael Simi, redator da Caps, integrante da holding Haus, ecossistema de agências do Grupo Stefanini.

Leia sobre o falecimento de Ronaldo Conde, aos 72 anos, aqui.

Leia texto anterior da seção "O Espaço é Seu", aqui.

O Espaço é Seu

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