O Espaço é Seu

A 70ª edição do Cannes Lions, realizada em junho último, nos apresentou uma série de novos futuros para o mercado de comunicação e entretenimento.

A relevância dada aos projetos orientados à construção de marca é um indicativo de como podemos criar um mercado de comerciais capazes de entreter e assumir um papel de relevância cultural.

Estes projetos me remetem aos princípios que defendemos desde a concepção de nossa produtora: propósito de marca, comunidade e linha editorial. A ideia é que é possível estabelecer uma entrega reconhecível e proprietária para, assim, acessar uma rede de pessoas que estejam alinhadas com aqueles princípios, sejam eles visuais, narrativos ou comportamentais.

Tínhamos dois filmes concorrendo no Cannes Lions: 'Lea', criado pela Ogilvy SP para Intimus, conta a história de Lea Campos, primeira árbitra de futebol do mundo, mas que por anos foi impedida de apitar por misoginia. Conquistou um Leão de Ouro em Entertainment for Sport. O outro filme é 'Exiled Team', criado pela Africa Creative para Brahma. Ele retrata a comunidade de Prudentópolis, no interior do estado do Paraná, o maior centro de ucranianos na América Latina. Recebeu um Leão de Prata em Entertainment for Sport e um de Bronze em Social & Influencer. O filme desenvolve a ideia da manutenção da cultura de um país em guerra. Realizada como um híbrido entre ficção e documentário, a narrativa é construída em torno da transformação de um time de futebol local, o A.A Batel, em Mariupol F.C - time da região de Mariupol, leste da Ucrânia, que deixou de existir por conta dos conflitos.

Os dois projetos são exemplos de uma mudança maior. Nos últimos meses, somente no mercado nacional, vimos marcas como Budweiser, Spaten e Nestlé construírem campanhas publicitárias com filmes entre dois e cinco minutos de duração, apostando no entretenimento e na relevância das mensagens para se criar valor via ‘earned media’. O movimento é especialmente interessante ao notarmos uma inversão da lógica vista até aqui, com KPIs de conversão e custo por lead em peças de 15s, 6s e até 3 segundos.

Outros festivais de publicidade já acenam com mudanças. Clio Awards, D&AD, AICP e The One Show abriram categorias para longo formato, acompanhando iniciativas internacionais como ‘Shout’, criado pela VMLY&R México para Movistar, ‘Your Life Wife Pixel’, criado pela Anomaly Berlim para Google, e 'The Wish', obra vencedora do Grand Prix em Film Craft no Cannes Lions 2022, criada pela Serviceplan Munich para Penny.

Dias, atrás, Jae Goodman, ex-chief executive officer da Observatory e ex-co-head da CAA Marketing, anunciou a criação dos "Superconnector Studios". Considerado um pioneiro em Brand Entertainment, o executivo é a força por trás da construção das áreas de entretenimento da Nike (Waffle Iron Entertainment), AB InBev (Draftline Entertainment) e a estruturação de uma nova fase de gerenciamento de IPs da Mattel, que hoje desenvolve sete longas-metragens e lançou 'Barbie' nos cinemas.

Em entrevista à Fast Company, Jae e seu sócio, John Kaplan, também ex-executivo da CAA, apresentam um modelo que conecta agências de publicidade, marcas, talentos, estúdios e empresas de mídia. Como o nome sugere, o relacionamento entre todas as pontas da cadeia é o passo definido para que "as indústrias de comunicação e entretenimento colaborem em um momento em que os streamers voltam a olhar para a publicidade".

Se há alguns anos as biopics assumiram o protagonismo da indústria cultural, com filmes como "Bohemian Rhapsody", "Rocketman", "Elvis" e "Blondie", hoje, filmes como "Air", "Tetris", "Barbie", "Blackberry" e "Flamin'Hot" alcançam sucesso de crítica em festivais como SXSW e interesse do público em escala global.

Para os criadores, o contexto permite o surgimento de projetos relevantes, com propósito, e que, como mencionou Goodman, "transformam a interrupção em uma experiência em si mesmo, onde a publicidade é também o entretenimento".

Willy Hajli, sócio e diretor de cena da Moonheist

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