Acesso exclusivo para sócios corporativos
Ainda não é Sócio do Clube de Criação? Associe-se agora!
Acesso exclusivo para sócios corporativos
Ainda não é Sócio do Clube de Criação? Associe-se agora!
Periferia precisa ser centro (Fabrício Natoli e Thiago Nascimento - Grupo de Planejamento)
Histórico. Inédito. A conferência mais disruptiva da história. Esse é o tom da reverberação da Conferência do Grupo de Planejamento, realizada no Capão Redondo, em São Paulo, com o intuito de sinalizar ao mercado que ainda estamos longe da realidade de quem consome, de quem é e faz o Brasil real.
Alguém se identifica?
Segundo todos os dados compartilhados pela Manoela Pagotto e Isabel Aquino em seu painel, regredimos em diversidade na comunicação, inexistindo praticamente inclusão racial em campanhas para pessoas na melhor idade e na categoria infantil continuamos reforçando a estereotipação de gêneros, como se estivéssemos na década de 1990.
Dados do Locomotiva nos mostraram que 67% dos consumidores brasileiros não se reconhecem na propaganda.
Isso é um fato, e o papel de um estrategista de comunicação também precisa ser ajudar a reduzir esse abismo.
Por que o brasileiro não se reconhece no que fazemos?
Por que?
Essa é a pergunta que precisa estar no centro da mesa de quem pensa e faz comunicação no Brasil.
A plateia refletia uma pluralidade de pessoas absurdamente maior do que a encontrada hoje em qualquer agência ou time de marketing, o que deixa claro que é sobre querer incluir, de verdade, e não somente falar que quer, nos releases.
Entre os palestrantes que subiram no palco, duas CEOs pretas, Dilma Campos e Eliane Dias e dois CEOs pretos, Ian Black e Felipe Silva, todos bem sucedidos mas que tiveram que fundar suas próprias empresas para liderar com maestria.
Então, falta capacidade ou oportunidade no topo do “poder”? Quem somos ou o que queremos ser?
No ambiente de atmosfera acolhedora, no auditório da belissíma UNASP, palestrantes no palco e pessoas na plateia se sentiram confortáveis para compartilhar suas fraquezas, inspirando confiança e empatia, tão fundamentais para o trabalho de estratégia. O oposto do proposto por vários ambientes ditos acolhedores e inclusivos.
“Ao contrário do que muita gente acha, dar apoio de carreira a alguém não é sobre técnica. É sobre o lado emocional também”, nos disse Yudi Nakaoka, do Crias do Plan.
“Fazemos sacrifícios para ter as mesmas referências de outros publicitários, mas temos que lembrar que nossa autenticidade traz o diferencial para o nosso pensamento”, destacou Keti Carvalho, do Publicitárias Negras.
Em ‘O Brasil de verdade’, Júlio Ribeiro dizia que a verdade está no balcão de quem vende e de quem compra. Já os londrinos, inventores da disciplina, dizem que “o planejamento é a voz do consumidor, das pessoas dentro da agência, e do cliente”. Isso fica mais possível de se fazer estando nas ruas, olhando para o Capão, para a Ceilândia, trazendo gente e entendimento das várias periferias e quebradas de todo o Brasil para o centro.
“A publicidade tem que andar a pé na periferia, ter empatia, observar”, destacou Eliane Dias, da Boogie Naipe.
Exatamente por isso o GP se propôs a fazer o planejamento voltar para a base: a olhar nos olhos de quem compra, de quem cria, e, como disse a Rafa Pinah: “ver de onde as tendências que são exportadas mundo afora nascem. Ou seja, nas favelas e não somente nos WGSNs da vida. Na ânsia de soar gringo, esquecemos de olhar para o Brasil de verdade, no detalhe”.
“Falamos de cinema iraniano, mas não de novelas. A publicidade diz que entende do Brasil profundo, que ela se conecta com o Brasil profundo, mas ela não gosta de ser o Brasil profundo. Não nas linhas de frente, não onde aparece pro cliente, não onde gasta a maior parte do investimento”, sublinhou Felipe Silva, co-fundador da Gana.
Vamos voltar à ideia do porquê, porquê, porquê?
É necessário questionar por que a periferia ainda não é o centro na nossa comunicação, dentro das agências, dos departamentos de marketing. Por que falhamos sistematicamente na inclusão de minorias e minorizados, na ascensão de pretos e periféricos ao topo? Por que os releases de contratação e fotos de confraternização continuam tão iguais? Por que a América Latina, da qual fazemos parte, continua tão distante na hora de buscarmos referências?
Para o planejamento de fato fazer a diferença no processo é preciso voltar a entender melhor de suas audiências, precisa garantir que a representatividade comece dentro de suas equipes, de suas lideranças e que o ambiente permita novas formas de analisar, de construir narrativas, de buscar referências, de ser linha de frente nos projetos.
Historicamente, o mundo publicitário cresceu de forma elitista, faculdades de ponta, intercâmbios, divulgação de vagas em petit comitê, tendendo a achar que tudo o que está longe do centro tem menor valor.
Mas a gente agradece aos que estão tentando. Às quase 300 pessoas que ocuparam o auditório: foi mágico. Aos que tentaram: fica para a próxima. Aos demais: da estação de metrô Capão Redondo até a de Moema são exatos 17 minutos: vale muito a visita.
O Brasil está lá. Os talentos estão lá.
Salve Racionais Mc’s, Eliane Dias, Poeta Sérgio Vaz, Léo Ribeiro e Tia Daag.
Obrigado ao coletivo que se uniu à gestão coletiva do GP para organizar, ao Flávio por abrir as portas da Unasp, à generosidade dos palestrantes e aos patrocinadores: AlmapBBDO, Publicis Group, Figura Design, Globo, Google e Aliança contra Estereótipos.
“O final tem a ver com o começo, somente o começo” (Cesar MC, rapper)
Fabrício Natoli e Thiago Nascimento - Grupo de Planejamento
Leia texto anterior da seção "O Espaço é Seu", aqui.