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“Vamos investir no Brasil”

Crise parece não intimidar Havas

09.05.16

Em São Paulo para apresentar o novo comando do Havas Creative Group Brasil, o CEO global da Havas Worldwide e do Havas Creative Group, Andrew Benett, conversou com o Clube de Criação sobre as perspectivas de negócios no Brasil, mesmo em tempos de crise, e sobre a expansão da operação por aqui. O Havas Creative Group Brasil – que reúne Havas Worldwide, Havas Worldwide Digital, BETC São Paulo e Arnold – passa a ser chefiado pela dupla Gal Barradas e Erh Ray, que continua liderando a BETC, aberta em fevereiro de 2014.

O novo comando estava para ser definido desde que Ricardo Monteiro anunciou que iria deixar a Havas Worldwide, o que acontecerá até o final do ano (leia mais aqui). Agora, Gal e Erh são co-CEOs, como na BETC. As projeções de Benett para o grupo no Brasil são positivas. Aquisições estão na mira e produtos e serviços digitais que existem lá fora devem ser incorporados às soluções oferecidas ao mercado brasileiro. Em relação à BETC, Gal afirma que a expectativa é dobrar a receita em relação a 2015. O crescimento permite pensar em contratações na agência, como Erh revela. Já para o grupo, Erh pondera que é necessário aguardar mais tempo para analisar as demandas e avaliar se será preciso contratar mais gente.

Confira a seguir trechos de entrevista de Andrew Benett. Na sequência, um panorama da operação no Brasil, traçado por Gal Barradas e Erh Ray.

Clube de Criação – Qual a importância do Brasil para o grupo? Qual a participação do país no total da receita?

Andrew Benett – O Brasil é incrivelmente importante para o Havas Creative Group (divisão do Grupo Havas que reúne as agências criativas, distinta da área dedicada aos negócios de mídia), por vários motivos. O primeiro é que se trata de um dos maiores mercados do mundo para um número grande de corporações internacionais. Não posso falar os percentuais de participação na receita global. Mas é um mercado que está no top 10 para nós. Ou seja, é importante para nossos negócios e é importante para nossos clientes. Outro motivo é que temos no Brasil parceiros incríveis com quem trabalhamos, como Erh e Gal. Nós não acreditamos que criatividade tem fronteiras. Queremos fazer um ótimo trabalho no Brasil para nossos clientes internacionais, regionais e locais. Queremos fazer trabalhos no Brasil para clientes que estão fora do Brasil.

Clube – Como avalia o histórico do grupo no Brasil?

Benett – Estamos crescendo. Tivemos sucesso na Havas Worldwide nos últimos anos. E a BETC já tem uma história de sucesso. Eles fizeram em dois anos algo tremendo. Todas nossas unidades estão em expansão. Não se trata de estarmos preocupadClube de Criaçãoos com o crescimento contínuo, mas de querermos criar um novo modelo de atuação do grupo no Brasil, oferecendo o que temos de melhor ao redor do mundo.

Clube – O que quer dizer com “novo modelo”?

Benett – Tudo no marketing está se desmanchando. O consumidor hoje é o chefe. Temos de segui-lo. Quem pensaria o que eles estão fazendo no Snapchat ou em qualquer plataforma emergente? Inteligência artificial, realidade virtual... essas tecnologias serão transformadoras da maneira como fazemos marketing e do modo como os consumidores se relacionam com marcas e produtos. Vejamos os influenciadores digitais e como o marketing trabalha com eles. Há muitas coisas que ainda não fazemos no Brasil e que fazemos há mais tempo em outros mercados no mundo. Queremos trazê-las para o Brasil. Voltando à história das linhas (entre as disciplinas) estarem sumindo, no final do dia, o negócio em que estamos é salvar nossos clientes em seus desafios e ajudá-los a encontrar oportunidades. No Brasil, a TV Globo é um forte player, mas pensamos em seguir o consumidor em toda sua jornada e engajá-lo de maneiras diferentes. Temos criado produtos e serviços digitais no mundo para ajudar a guiar nossos clientes, levando em conta a tecnologia adotada pelo consumidor. Não creio que haja uma agência no Brasil fazendo algo semelhante. E nem que isso ocorra em muitas agências pelo mundo.

Clube – Sobre os influenciadores e sobre as experiências que oferecem lá fora, isso significa que estão trazendo algo mais específico para o mercado?

Benett – Temos uma plataforma global que identifica influenciadores. É  uma tecnologia na qual investimos nos últimos dois anos e aponta quais são os melhores influenciadores para as marcas. Nós, então, trabalhamos com eles para que façam conteúdo. Temos uma parte de analytics, que analisa o valor do que eles estão publicando. É uma plataforma que está tendo grande sucesso com clientes como Nike e grandes bancos. É algo novo porque tivemos de desenvolvê-lo em dois anos. Realmente acredito que nada parecido exista no Brasil. Não com o mesmo nível de investimento, de rastreamento, com case studies comprovando o sucesso.

Clube – Há outros exemplos?

Benett – Muitos de nossos clientes estão interessados nos millennials. Criamos um brand studio, chamado Annex, que é um estúdio para conteúdo, que é feito inteiramente por millennials para marcas. Temos estúdios em Chicago, Nova York, Los Angeles. Lançamos na Europa, neste ano. E esperamos lançar em São Paulo neste ano também. Estamos muito animados em trazer esse tipo de trabalho para o Brasil. No ano passado, fizemos uma parceria com o Watson, da IBM, para desenvolver produtos e serviços. Vamos fazer isso aqui também.

Clube – O Brasil está no meio de uma crise econômica e política. Hoje, não sabemos o futuro do país. Em Paris, há um número grande de protestos, principalmente contra mudanças nas leis trabalhistas. Há as questões de imigração na Europa. Com cenários como esses, não fica mais difícil para as empresas fazerem negócios?

Benett – No Brasil, temos visto nos últimos dois anos uma redução dos investimentos dos clientes em marketing. Não estamos perdendo clientes, mas eles estão investindo menos e isso tem implicações em nossos negócios. Globalmente, há movimentos populares acontecendo. No Brasil, há um forte sentimento contra o governo e contra os políticos, assim como no mundo. No Panamá, fizemos uma campanha com o tema “no pockets” – os políticos não podiam colocar dinheiro nos bolsos. Espero que a situação se normalize com uma melhora nos sistemas regulatórios e com uma melhor governança em relação à maneira como os políticos atuam. Lá fora, temos o cenário econômico europeu e asiático, com populações sofrendo já há algum tempo. No Japão, faz anos que a economia não vai bem. Na Espanha, há ainda um índice de 25% de pessoas desempregadas, há a crise de imigração. Todas essas coisas estão vindo juntas. As pessoas estão cansadas de viver isso. Não se trata só de política, mas sim de fatores macroeconômicos. Então, é preciso fazer um trabalho de país em país. Não é uma questão simples.

Clube – Normalmente, em meio a uma crise, as empresas tendem a se tornar mais conservadoras e se afastar de investidas criativas.

Benett – Se olharmos para muitos dos case studies feitos a respeito de crises, verificamos que as companhias que se saíram melhor num período maior de tempo foram aquelas que mantiveram seus investimentos não somente em marketing, mas em inovação.

Clube – Quais suas perspectivas para o Brasil para estes próximos meses?

Benett – Nossos planos são de investir no Brasil. Estamos pensando em aquisições. Vamos investir nos nossos funcionários, nas operações. Falamos do crescimento e do imenso sucesso da BETC. O Havas é a sétima maior agência do país (segundo o Ibope Monitor). Temos fortes operações.

Clube – Que tipo de aquisições?

Benett – Há disciplinas para as quais estamos olhando. Há áreas como conteúdo, PR, digital. Nós olhamos o que temos no grupo e o que podemos oferecer a mais para nossos clientes.

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Brasil: operar no modo startup trouxe vantagem

Quando a BETC São Paulo foi lançada, em fevereiro de 2014, o Brasil era outro. Na ocasião, havia até a perspectiva da agência figurar entre as 20 maiores do país, em cinco anos. Era um plano ambicioso. Mas o Brasil mudou e a ótica da agência também. Gal Barradas, co-CEO da agência – e agora também do Havas Creative Group –, comenta que essa visão, baseada no ranking das maiores agências que é medido pela compra de mídia, deixou de fazer sentido para eles. “Ser o maior comprador de mídia não significa que a agência esteja fazendo necessariamente um bom trabalho. Essa é a questão, afirma. Segundo Gal, não é possível mais levar esse tipo de ranqueamento em consideração porque a agência tem diversas disciplinas no negócio. “Prefiro falar em termos de fee. Esse é o index que nos importa.”

Co-CEO junto com Gal, Erh Ray reforça esse conceito ao salientar que a BETC está no top 5 em novos negócios, conforme levantamento feito pelo jornal Meio & Mensagem, baseado em conquistas de contas em 2015. A BETC aparece em quinto lugar. Em dezembro, a BETC conquistou a conta de Peugeot, cliente atendido pela rede em outras partes do mundo (mais detalhes aqui). Também rechearam a carteira da agência em 2015 Parmalat, Hering e Sephora.

Diante de tais conquistas, qual a perspectiva de fechar este ano? “Devemos praticamente dobrar a receita”, calcula Gal. Com isso, Erh conta que a agência deverá contratar mais gente em 2016. Co-CEO do Havas Creative Group, ele espera ter nos próximos dois meses respostas sobre possível expansão.

Quanto à crise, Gal entende que a BETC ficou bem resguardada não apenas pela conquista de clientes, mas pela filosofia de trabalho. Pode soar esquisito o que vou dizer. Mas ser uma startup tem suas vantagens. Porque assim existe a oportunidade de se construir um modelo de negócios que está completamente alinhado ao atual momento. É muito mais difícil para uma agência tradicional e grande fazer movimentos, fazer ajustes”, analisa. De todo modo, ela defende que há dois pontos importantes a considerar em um cenário de crise. Um é continuar acreditando no sonho. O outro é fazer uma boa gestão.

Nós estruturamos a agência olhando para a atual demanda dos clientes, na qual os budgets estão migrando cada vez mais de um modelo focado na mídia tradicional para uma estratégia omnichannel. Nós podemos discutir qualquer tipo de experiência. Publicidade, serviços, produtos fazem a comunicação da marca”, acrescenta Gal. Para ela, o desafio das agências, portanto, é encontrar novos modelos de negócios que se alinhem a essa realidade. “Nós conseguimos fazer isso. Porque, já que começamos como uma startup, nós conseguimos construir qualquer coisa. Creio que isso responde por grande parte do sucesso da BETC nesses dois anos”, defende.

Andrew Benett, CEO global da Havas Worldwide e do Havas Creative Group, observa, porém, que a BETC São Paulo já é uma “grande startup”. Segundo ele, a agência cresceu, mas o conceito permaneceu. “O importante é essa filosofia de startup: inove para os clientes, experimente novas coisas. Não é porque uma agência cresce que ela deve ser lenta ou tradicional”, explica.

Pela BETC, Gal Barradas e Erh Ray continuam se reportando a Rémi Babinet, presidente da rede de agências. Pelo Havas Creative Group Brasil, eles respondem a Benett. Por aqui, a estrutura do grupo se divide da seguinte forma: Armando Strozenberg é chairman da Havas Worldwide Brasil; Maurício Kato é CEO da Havas Worldwide São Paulo; Vivian Ferraz preside a Havas Rio e Douglas Patrício é CEO da Z+ e diretor da Havas Worldwide América Latina (exceto Brasil).

Fotos de Gustavo Scatena

“Vamos investir no Brasil”

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