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Disputas, desobediência e resistência em tempos de ódio
Ao abrir o debate “Liberdade de expressão: Desobediência e Resistência”, o mediador Alê Youssef, mestre em filosofia, produtor, comunicador e ativista, remeteu à mesa que mediou no Festival do Clube de 2015, focada em ocupação ou retomada do espaço público. Naquela ocasião, discutiu-se a postura do mercado em relação ao tema. “Mas aquilo ali foi antes do que podemos chamar de caos, que é o que o Brasil está vivendo, em várias frentes: ética, política, institucional.” Segundo Youssef, pautas como a discutida em 2015 acabam ficando em segundo plano por causa desse caos, diante do qual desobediência e liberdade ganham um papel muito importante.
Primeira a falar, Luciana Ceccato, diretora de atendimento da CP+B Brasil, afirmou dar “graças a Deus estarmos vivendo o que chamamos de caos” e que o lema “'Ordem e Progresso' é uma calhordice, porque da ordem não vem nenhum progresso”. Como exemplos de desobediência, ela cita o questionamento na fila de um hospital quando alguém tenta passar na frente dos outros; ou quando ela decide ir de ônibus ou trem ao trabalho mesmo tendo carro na garagem; ou quando quer tirar um briefing melhor – o melhor possível – de seus clientes.
Entrando na discussão sobre mercado, caos e tensões sociais, Luiza de Andrada e Silva, diretora executiva do Instituto Cidade em Movimento, focado na ocupação do espaço público, provocou: “Qual é o papel do mercado [na questão do espaço público, uma das tensões discutidas no painel]: ajudar a fazê-lo ser mais compartilhado, ou mantê-lo todo dividido em quadradinhos?”.
Para o fotógrafo e diretor de cena João Wainer, vivemos um retrocesso maior do que os avanços conquistados – daí a importância da discussão sobre desobediência. “Talvez o maior passo seja ter eleito o cara que menos entende de rua entre todos os prefeitos que elegemos nas últimas décadas”, citou, em referência a João Dória (PSDB). “Talvez a única solução que a gente tenha seja a desobediência. E não sei bem como fazer isso.” Ainda segundo ele, parte do papel do mercado em entrar em debates como o da ocupação do espaço público pode estar em iniciativas como o envolvimento com o Carnaval de Rua.
Na visão de Giselle Beiguelman, artista e professora da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (FAU-USP), não existe inovação sem mudança e desobediência – e essa é uma questão não só de política, mas também de mercado. “O marketing do medo é fundamental para a manutenção de um status quo muito perigoso, que nós precisamos combater”, afirmou, adicionando que esse medo permeia diversos campos: arte, mercado de trabalho, economia, política. “A maneira de resistir a isso é desobedecer a tudo e todos, em todos os níveis, desde nossa experiência pessoal até recuperando o diálogo comum.”
Ela ressaltou que, na ausência de diálogo, de espaço para o contraditório, perdemos todos. Como exemplo, cita a questão da exposição do Santander Cultural, suspensa após críticas nas redes sociais. Para ela, faltou diálogo com o curador da exposição por parte do banco. Juntos, poderiam pensar em como criar uma experiência educativa para todos; faltou abrir espaço dentro do museu para se debater de forma construtiva os questionamentos feitos nas redes sociais - mesmo que se discorde dos argumentos usados pelos críticos.
A mesa ainda debateu questões como o pixo, o ódio e o binarismo simplificador trazido pelas redes sociais – e o papel que marcas devem ter num contexto no qual é impossível agradar a todos. Wainer arrancou risos da plateia ao defender que elas deveriam escolher um lado, sim – o certo. O fotógrafo, diretor do documentário Pixo, afirmou que o grafite deixa de ser grafite quando se torna patrocinado por uma empresa. Mas que isso é válido. Isso porque, na visão de Wainer, o conceito de grafite remete a algo questionador e independente, feito sem autorização.
Como o grafite é considerado mais bonito do que uma pichação, foi aceito pelas marcas e vem sendo adotado em projetos. "Mas a partir do momento em que há um cliente, isso vira outra coisa", disse. Para Wainer, ele se torna uma expressão de arte urbana, e não mais um ato de contestação. Luciana, nesse momento, pontuou um dos problemas das agências nesse sentido: quando se desenvolve um projeto, ela pode ser criticada por desvirtuar o propósito da expressão e de um movimento. E, quando não faz nada, também pode receber críticas.
Giselle ressaltou que a internet mostrou o quanto somos horríveis, e isso é importante para suscitar discussões sobre o limite da liberdade de expressão. “Liberdade de expressão não é falar o que quiser onde quiser. Se passa a fronteira dos direitos humanos, não tem liberdade de expressão, não.” Ela está com um trabalho no Sesc 24 de Maio que ressalta um desses lados horríveis. É o Odiolândia, um vídeo de 5 minutos criado a partir de frases de ódio colhidas depois da ação policial que desmantelou a área conhecida por Cracolândia. Para montá-lo, Giselle reuniu comentários nas redes, excluindo-o os que partidarizavam o fato, e os apresentou em um vídeo sem imagens, apenas os textos. Como som de fundo, um áudio com registros reais de como foi a ação. "Muitas pessoas não conseguem ficar o tempo inteiro na sala. Elas não aguentam o tranco", contou.
Ao final, os participantes seguiram para o Jardim das Goiabeiras, local na Cinemateca em que o Festival do Clube, montou um espaço para que o público possa conversar por mais tempo com os palestrantes. Por 30 minutos, os participantes do painel aprofundaram a conversa sobre limites, partidarização de pautas e desobediência civil. Uma das conclusões foi que é preciso distinguir causas de partidos, como observou Alê Youssef. A causa poderia aglutinar mais forças.
Eduardo Zanelato
Serviço:
Festival do Clube de Criação 2017
Quando: Setembro, 16, 17 e 18 - 2017
Local: Cinemateca Brasileira - São Paulo – Brasil
Largo Senador Raul Cardoso, 207, Vila Clementino
www.festivaldoclubedecriacao.com.br
https://www.facebook.com/clube.clubedecriacao
https://twitter.com/CCSPoficial
#FestivaldoClube2017
Hosted by: Clube de Criação
Temos Shuttle para quem quiser estacionar no Hotel Pullman Ibirapuera
Horário: das 08h30 às 22h30
Trajeto: Pullman / Cinemateca / Pullman
Tarifa especial para o Festival: R$ 35 o período