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Paulistano que virou carioca: parte 2
Eu estava com 58 anos quando fui eleito cidadão carioca. Mas, na verdade, me sentia carioca desde criancinha, quando, aos 6, estive pela primeira vez no Rio de Janeiro, levado pelos meus tios Ligia e Armando Meloni.
Lembro que ficamos hospedados no Hotel Lancaster, na Avenida Atlântica, que me encantei com absolutamente tudo do Rio e só me assustei com a temperatura da areia de Copacabana, que era muito mais quente que a de Santos, a que eu já estava acostumado. Era impossível ir à praia descalço naquele Rio de Janeiro que, na segunda metade dos anos 1950, ainda era a capital federal e vivia intensamente a construção do Aterro do Flamengo.
Lembro também que foi nessa primeira viagem que experimentei pela primeira vez o picadinho do restaurante do Hotel Ouro Verde, prato que foi um dos meus preferidos durante muitos anos e que só substituí, tempos depois, pelo picadinho da Roberta Sudbrack.
Com 20 e poucos anos, eu, que morando em São Paulo ostentava o pomposo título de diretor nacional de criação da DPZ, comecei a dividir meus meses entre São Paulo e Rio. Ficava 20 dias por mês em São Paulo e dez no Rio, onde a agência havia montado uma filial na Rua do Russel, no bairro da Glória.
Era a época do auge do Antonio’s, no Leblon; do Bar Lagoa e do Chico’s Bar; do Nino’s, na Bulhões de Carvalho — maliciosamente apelidada de Rua “Quase, Quase” — e do Monte Carlo, na Duvivier, pertinho do Copa e em frente ao antigo Beco das Garrafas.
Era a época em que, mesmo sendo mangueirense, eu frequentava a feijoada da Portela. Era a época em que eu ainda não tinha ideia de que logo depois fariam parte desse meu roteiro sentimental o Grottammare, dos irmãos Neroni, em Copacabana; e o Cândido’s, em Pedra de Guaratiba. Era a época em que o Hotel Le Méridien ainda não existia, e o Laurent Suaudeau ainda não havia chegado para revolucionar a gastronomia brasileira. Era a época em que eu, solteiro, namorava cariocas. Na verdade, não namorava cariocas; namorava uma rua. Por um desses estranhos mistérios do planeta, todas as namoradas que eu arrumava moravam na Timóteo da Costa, no Leblon.
Por outro mistério do planeta, em 1976, durante a famosa invasão corintiana ao Maracanã para o jogo contra o Fluminense nas semifinais do Campeonato Brasileiro, eu, que vivia os meus dez dias mensais de carioca, acabei me transformando num caso raro de invadido e invasor ao mesmo tempo. Como morador da cidade, mesmo que temporário, eu era invadido; mas, como corintiano, eu era invasor. Tanto que amei quando a torcida corintiana, duas horas antes do jogo, já tomando conta de metade do estádio, abriu sua famosa faixa que dizia: “Cariocas, bem-vindos ao Maracanã”.
Desde meus tempos de DPZ — que duraram de 1973 a 1986 — até os dias de hoje, o Rio de Janeiro foi se tornando cada vez mais presente na minha vida, e eu cada vez mais presente na vida do Rio de Janeiro.
Quando inaugurei a W/ em São Paulo, fiz questão de que a agência montasse imediatamente seu escritório em Ipanema. Nessa época, disse uma frase que acabou ficando conhecida: a W/Brasil é a única agência de publicidade do mundo que tem duas matrizes.
Uma coisa que não mudou desde minha infância até hoje é que o Rio de Janeiro continua sendo a única cidade do mundo capaz de transformar em local alguém que não nasceu lá.
Pensei nisso em 2010, quando tive de eleger as pessoas que fariam parte da mesa da cerimônia na Câmara Municipal e convidei, propositalmente, cariocas de diferentes lugares para me acompanhar: André Midani, carioca de Paris, na França; Ricardo Amaral, carioca das Perdizes, na cidade de São Paulo; José Bonifácio de Oliveira Sobrinho, o Boni, carioca de Osasco, no Estado de São Paulo; Milton González, o Uruguaio, do Posto 9, carioca de Montevidéu; Zuenir Ventura, carioca de Além Paraíba, nas Minas Gerais; e Walter de Mattos, carioca da gema.
Washington Olivetto
Publicitário
washington@washingtonolivetto.com.br
Texto publicado no jornal O Globo
Leia texto anterior da Coluna do W.O., aqui.