SXSW 2023

Às vezes, um painel do SXSW traz reflexões que te põe a pensar mais ou menos como se estivesse dentro do filme “Tudo em todo lugar ao mesmo tempo”, que conquistou na noite deste domingo, 12, sete Oscar, entre eles o de Melhor Filme. Horas antes de o filme, estrelado por Michelle Yeoh (Melhor Atriz), ser consagrado pela Academia, o designer norte-americano John Maeda, vice-presidente de design e inteligência artificial da Microsoft, fez a plateia pensar em algumas das tecnologias que mais ocupam os espaços em Austin de formas muito peculiares.

Se no longa super campeão do Oscar há um momento em que duas pedras protagonizam um dos melhores diálogos do roteiro, Maeda levou para o palco do SXSW a analogia com uma embalagem de ketchup. O assunto era o onipresente ChatGPT (que ele brincou, misturando as letras finais, para refletir a confusão que o nome provoca).

“Lembram como era antes dessa tecnologia avançada de apertar a embalagem para o ketchup aparecer? Costumava ser uma garrafa de vidro, muito difícil tirar o ketchup do fundo”, disse. Quem quisesse mesmo jogar nas batatas fritas poderia recorrer, quem sabe, a uma faca. Ou bater no fundo – o que frequentemente terminava com um mar de molho sobre o alimento. Ou aceitar que as fritas vão ser consumidas sem nada extra.

Pois o ChatGPT é a embalagem atual, a de espremer. Dá para ter ketchup à vontade, sem o esforço do passado.

Embora Maeda não tenha falado isso (possivelmente pela Microsoft ser uma investidora da OpenAI, a dona do ChatGPT), isso não quer dizer que a facilidade de ter ketchup significa que o consumidor vá moderar a quantidade de molho sobre a comida.

Maeda apresentou no SXSW seu novo “Design in Tech Report”, relatório que teve sua primeira edição em 2015 – e que foi lançado na conferência, em Austin. O resumo do estudo – como o designer fez questão de exibir no telão – segue abaixo e o relatório pode ser acessado aqui:

- Os designers tendem a se preocupar com as pessoas como pessoas. Em vez de apenas como clientes em potencial ou clientes.

- O design como um campo evoluiu para falar mais de máquina, escala e dinheiro.

- Muito trabalho foi feito no mundo do design para criar uma nova “estética da ética”.

- Falar “humano” (como se fosse uma língua) será mais importante do que falar “máquina”.

- O relatório do próximo ano será centrado no valor comercial desse novo tipo de design.

Mais duas alegorias chamaram atenção na apresentação de Maeda. Uma delas equipara o cérebro a uma tesoura. A comparação não é dele (ele a ouviu muitos anos atrás), porém ela se encaixa no cenário atual, segundo o designer. Uma lâmina é a cognição, o poder do pensamento. A outra é o contexto, o poder da memória. “Acho maravilhoso porque ajuda a explicar como usar a linguagem, porque a lâmina de cognição é o modelo básico pré-treinado. É uma espécie de lâmina mágica que você pode trabalhar com os ritmos do pensamento”, afirmou. Combinada com a outra lâmina, a do contexto, cria-se energia. O bom encaixe resulta em um trabalho eficiente.

E, por fim, vem a analogia que arrancou gargalhadas do público: a dos biscoitos e a pilha de roupa suja. O conceito também não é recente: data de 2005. É o “cookie and laundry principle”. Para compreendê-lo, pense numa criança. Se oferecermos para ela um biscoito grande e um pequeno, qual ela provavelmente aceitará? O grande (a menos que comer um biscoito grande não lhe dê prazer). E se lhe for apresentada uma pilha de roupas para lavar? Ela vai preferir a menor, em vez da maior. Isso estabelece um contraponto entre aquilo que nos alegra e aquilo que não curtimos.

“Percebi que essa é a forma de abordar a IA também. Temos de saber quando queremos fazer mais versus quando queremos fazer menos. Podemos viver a vida com mais prazer e menos dor e a IA pode nos ajudar a fazer isso”, declarou.

Maeda propôs que as pessoas usem a inteligência artificial para que esta nos livre do que não queremos fazer (a pilha de roupas para lavar) e, assim, sobre tempo para as coisas que despertam prazer (o biscoito).

A cobertura do SXSW 2023 pelo Clubeonline tem patrocínio de Audaz, Brunch – Influência de Verdade, Ça Va, Modernista Creative Producers e Vandalo.