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Vini Jr. e nós (Hanna Batista)
A derrota de Vini Jr. na Bola de Ouro mexeu profundamente comigo. Como mulher negra no audiovisual, senti aquela velha dor de ver o talento negro sendo colocado de lado. Ver alguém como Vini, que não só joga, mas representa, ser empurrado para segundo plano é exaustivo. Ele é mais que um atleta; ele é resistência, habilidade, orgulho em um campo onde a cor ainda pesa. E, para quem conhece essa batalha, a derrota dele não é só dele. É nossa.
Aqui, no audiovisual, vejo a mesma coisa acontecendo. Quantas pessoas diretoras negras têm suas histórias e seu talento ignorados enquanto veem outros ocuparem posições de destaque, entregando o mínimo e o mesmo? Já me ofereceram tantas vezes orçamento reduzido ou me disseram que só eu poderia dirigir “esse tipo de história”, como se o racismo fosse nosso único tema. O mercado inventa desculpas de que faltam experiência, encaixe, contexto. Mas o que falta, na verdade, é coragem para apostar em quem não se encaixa no velho padrão.
Assim como Vini, que desafia as expectativas a cada jogada e, ainda assim, não recebe o reconhecimento que merece, muitos de nós, pessoas diretoras negras, enfrentamos uma realidade em que nossas vozes e visões são minimizadas e silenciadas. A excelência de Vini é um reflexo do que nós buscamos no audiovisual: queremos ser vistos e valorizados pelo que realmente somos, não apenas pelo estereótipo que o sistema insiste em nos impor. Sua luta se torna a nossa luta; enfrentamos uma indústria que ainda hesita em reconhecer o nosso potencial pleno, como se só pudéssemos ser a “exceção” em vez de a regra.
A derrota do Vini é muito mais que um prêmio perdido. É o lembrete de que a excelência negra ainda é vista como uma “exceção”, quando, na verdade, é puro mérito. Sei o que ele sente ao não ser celebrado como merece, ao ver o próprio potencial ser minado por dúvidas invisíveis. E também sei que a verdadeira mudança só virá quando a gente puder ser quem é, sem precisar passar por essas barreiras do improvável.
Este ano, tenho ouvido de colegas pessoas diretoras negras, mais do que em qualquer outro momento, que estão pensando em desistir da direção. Inclusive, foi algo que permeou meus pensamentos este ano. O peso das portas fechadas e da falta de reconhecimento se tornou quase insuportável. Cada história não contada, ou contada pelas pessoas erradas, e cada projeto rejeitado são como uma gota que transborda o copo da nossa paciência e determinação. Mas é nesse momento que devemos nos lembrar de quem somos e do que representamos.
Para os colegas, pessoas diretoras negras, deixo um recado: sigam em frente, não desistam. Sei que é exaustivo, que cada porta fechada parece tirar um pouco da nossa esperança, mas nosso lugar é aqui, é agora. A gente carrega uma história, uma visão e um talento que ninguém pode tirar. Sigam criando, sigam contando nossas histórias e as histórias que quiserem contar. Nosso trabalho não é invisível, e nossa presença só vai se tornar mais forte e real se não desistirmos. Lembrem-se: desistir não faz parte da nossa cultura.
Hanna Batista, diretora de cena da Miss Sunshine
Leia texto anterior da seção "O Espaço é Seu", aqui.