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O Espaço é Seu

Seu colega de trabalho pode ser trans e querer que você saiba (Gael Penha)

30.01.25

oito meses iniciei minha trajetória na publicidade de uma maneira que jamais imaginei. Após deixar minha terra, a cidade de Natal, no Rio Grande do Norte, e me mudar para São Paulo, encontrei a minha primeira oportunidade formal de emprego na AKQA Casa por meio do programa AKQA na sua Casa (leia mais sobre o programa aqui). As experiências de cada um são muito plurais, mas no meu caso, quero que você saiba: eu sou um homem trans, negro e nordestino.

Essa informação não é segredo e nem deveria soar como uma grande revelação. Eu não chego por aí falando que sou flamenguista. Mas, de repente, se o assunto for futebol, todos irão saber. Na pausa pro café, acho pouco provável o papo girar em torno deste que é o mês da Visibilidade Trans, mas se assim fosse eu deixaria claro que é uma alegria e um tristeza estar entre os apenas 0,38% de pessoas trans empregadas no Brasil ("O Mercado de Trabalho para Pessoas Trans no Brasil", Datafolha, 2024 - leia matéria do G1 sobre o assunto aqui).

Infelizmente, a vulnerabilidade dessa população é brutalmente evidenciada em dados. Segundo o grupo Gay da Bahia ("Relatório Anual de Violência Contra LGBTs no Brasil”, GGB, 2023, aqui) há uma alta taxa de homicídios e violências físicas e psicológicas contra pessoas trans e travestis. E eu poderia seguir aqui com outras referências desalentadoras. Mas hoje não.

Hoje eu quero falar sobre a construção de lugares seguros onde a gente possa existir do jeito que a gente é – como deve ser. A inclusão no mercado de trabalho é uma responsabilidade coletiva. Empresas comprometidas com este processo, principalmente com aqueles que vivem nas margens, não apenas criam ambientes mais ricos e completos, mas também investem no bem-estar e no desenvolvimento de seus colaboradores. Isso impacta positivamente a saúde emocional das pessoas envolvidas, garante acesso a recursos essenciais, fortalece a comunidade e abre novas possibilidade de sonhar o futuro.

Tendo em vista uma realidade social que constroi uma necropolítica em torno de nós, sobretudo numa dinâmica que invisibiliza pessoas transmasculinas, sempre me vi em situação de sobrevivência. Mês após mês, a única opção era “dar um jeito”. Hoje, na AKQA Casa, me encontro a sonhar pela primeira vez. Para além de toda a troca (pessoal e profissional), com tanta gente bacana disposta a ensinar e aprender, ganhei esse plus: AGORA POSSO TER SONHOS. Aos 32 anos, finalmente vejo a possibilidade de entrar na faculdade, ter filhos, casa própria e tudo que um cidadão comum deseja alcançar. Conquistas impossíveis sem a estabilidade de um emprego formal. Hoje, com muito orgulho, me reconheço como profissional, amo o que faço e sigo animado com tudo que ainda irei desenvolver e maturar. Novas possibilidades. Um universo sendo reinventado. Afinal, se cada pessoa é um mundo, abrir essa porta foi uma grande revolução no meu.

O mercado criativo tem o poder de influenciar as massas e combater a desinformação. Quando grandes marcas incluem nossos corpos e vivências em campanhas publicitárias (como parte de sua equipe e também protagonista de narrativas que saiam dos estereótipos), elas ajudam a desmistificar a ideia de que pessoas trans são “anormais”. Posso citar como exemplos os trabalhos da Havaianas com a atriz e modelo trans Leona Jhovana, ou a Natura, que incluiu a atriz Luana Muniz. É como no trecho da música “Poco”, das cantoras Tasha e Tracie: “não me amo se não me vejo”. Nessa linha de raciocínio a gente conecta esse papo.

Apoiar organizações de defesa dos direitos LGBT+ e investir em programas que promovam a inclusão social e o bem-estar de pessoas trans, contribui com a sociedade e gera um ciclo positivo de mudança. Como parte do resultado também, ganham a confiança de consumidores, especialmente os mais jovens, cada vez mais atentos às práticas empresariais. Segundo uma pesquisa da PwC, cerca de 55% dos consumidores em todo o mundo afirmam estar mais dispostos a comprar de marcas que demonstram compromisso com questões sociais e ambientais. Isso mostra que as empresas não apenas podem mudar a vida das pessoas trans através de ações diretas, mas também por meio da criação de um movimento de inclusão que ecoa em toda a sociedade. Agora, mais do que nunca, precisamos de aliados. Então, bora conversar?

Gael Penha, operations assistant da AKQA

Leia texto anterior da seção "O Espaço é Seu", aqui.

O Espaço é Seu

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