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Despreparada para PcD; desgastante para Chevrolet
A estreia do Big Brother Brasil 24, na noite da segunda-feira (8), trouxe uma primeira falha grave, que repercutiu nas redes sociais, relacionada à prova do líder, patrocinada pela Chevrolet, que é a representante automobilística no reality pela segunda vez (2023 e 2024). O reinado anterior era da Fiat, que só havia estado fora do BBB em 2017.
Na competição, de resistência, valendo um carro da marca para o vencedor, os participantes precisavam completar um circuito de obstáculos e apertar um botão. Nas redes sociais - desde a noite da segunda-feira, já que a situação foi exibida ao vivo no programa de estreia - muitas pessoas apontaram para a "falta de acessibilidade" do desafio, criticando o fato de que o medalhista paralímpico Vinicius Rodrigues, um dos brothers deste edição, logo depois da fase de testes da prova, foi escolhido para encarar a disputa e tenha precisado tirar a prótese da perna esquerda para continuar o desafio - o que por pouco não acarretou em sua desclassificação, pelo tempo perdido. Sem falar no fato dele ter de retirar sua prótese, sem estar previamente preparado para isso, na TV, ao vivo, se expondo sem que saibamos se foi algo confortável, tranquilo, aceitável para ele. Sim, ele está em um reality show, mas isso não significa que não preferiria poder usar o reservado para fazer as trocas de próteses necessárias. E, sim, ele tem um modelo específico que pode ser molhado, para usar no banho, na piscina ou em provas como a que ocorreu.
Todo esse desenrolar da disputa foi exibido, take a take, deixando estarrecida parte dos telespectadores. Um desgaste para o programa, para a emissora e, obviamente, para a marca que dava nome à prova.
O ativista e "influenciador" Ivan Baron, por exemplo, postou o seguinte comentário: "Na 1ª prova do líder não pensaram em acessibilidade e o Vinicius já foi prejudicado. Não queremos privilégios para ele, mas é preciso ter equidade na competição para que sua deficiência não seja algo que atrapalhe seu jogo!"
A disputa começava com uma queda em uma piscina de bolinhas. Em seguida, os competidores deveriam sair dela por uma escada, rastejar por uma trincheira com tinta verde e, por fim, apertar um botão para confirmar a conclusão do circuito em um tempo máximo pré-definido.
Durante a madrugada, ainda com a prova valendo e depois de Vinicius já ter deixado claro que não poderia molhar essa prótese, foi permitido enfim que ele pudesse trocá-la: produção do BBB acordou.
Procuradas pelo Clubeonline, Globo, Chevrolet e Commonwealth//WMcCann (divisão da WMcCann para atendimento à montadora) não se pronunciaram até o momento. Existe a expectativa de que a Globo vá se posicionar ao vivo, durante o reality show, na noite desta terça-feira (9).
Além do patrocínio à prova do líder, a Chevrolet está divulgando a promoção CCC (Concorra a um carro Chevrolet) - que brinca com a sigla do reality show - BBB. A "influencer" Kéfera Buchmann protagoniza a ação (leia aqui).
Combinação de erros
Para Ana Clara Schneider, fundadora e diretora executiva da Sondery, consultoria de acessibilidade para projetos e campanhas inclusivas envolvendo pessoas com deficiência, a situação foi uma combinação de erros que poderiam ter sido previstos. Em sua visão, a prova não teve o planejamento e a organização necessários. Os problemas começaram na concepção da prova. "Quando há uma pessoa com deficiência no jogo, a dinâmica precisa ser pensada para que ela possa participar de igual para igual", disse. As falhas poderiam ter sido previstas "se houvesse alguém olhando especificamente para acessibilidade e acomodação", completou.
A análise de Ana Clara envolve ainda os comentários e falas de outro participante, o catarinense Maycon, com "uma carga de deboche e provocação". Este participante sugeriu com ironia, por exemplo, que deveria ser dado um apelido à prótese de Vinicius. "A falta de acessibilidade foi muito concreta mas é mais facilmente corrigida. Basta pensar alternativas de formatos, atividades e estruturas", disse. Já o capacitismo é estrutural e sutil, segundo ela. Está presente nos discursos. Portanto, é muito mais complexo de ser reconhecido e corrigido.
A profissional ainda destacou que é importante entender que uma prova acessível não é uma prova diferente para cada participante, ou adaptada para apenas um. "É uma prova em que todos os participantes, com ou sem deficiência, tenham as mesmas condições de acesso com segurança, independência e autonomia".
Quanto à repercussão, Ana Clara comentou que o impacto dessa prova do líder tem o potencial de "trazer à tona situações que acontecem diariamente na vida de milhões de brasileiros" - e sobre as quais outros milhões não têm consciência alguma. Em sua avaliação, as reações mostram que, se por um lado, esse assunto é um universo desconhecido por muitos, gerando dúvidas e questionamentos, por outro há um grupo que se posiciona e cobra atitudes e ações. De acordo com ela, é possível uma aproximação desses “dois mundos” por conta dessa e de outras situações "que certamente acontecerão ao longo do programa".
Leia também o texto "Pessoas com deficiência não estão nas campanhas", assinado em 2023 por Ana Clara Schneider, na seção "O Espaço é Seu", do Clubeonline (aqui).