Este ano é diferente de tudo. Na Carta ao Mercado, o Clube de Criação explicou a razão de não ter cancelado seu prêmio, apesar de estarmos em meio a uma pandemia que está obrigando o mundo a rever processos, posturas e perspectivas (leia aqui ). Para relembrar apenas um dos argumentos: “sabemos da importância que a Criatividade tem para o nosso negócio. Isso, nos parece, entra na Categoria Inquestionável. Se, neste momento que vivemos, mais isso nos for tirado, realmente não sobrará nada”.
O 45º Anuário fará, como em todas as edições anteriores, a celebração do melhor que a Criatividade publicitária produziu neste país. E o fará também com algumas diferenças. A começar pelo julgamento, que será virtual.
E há outra novidade: todos os júris são compostos de 50% mulheres e 50% homens. A edição traz, desse modo, um importante foco na diversidade (veja quem faz parte dos júris). Além disso, o 45º Anuário conta com nova categoria: Periferia Criativa – o regulamento pode ser conferido aqui.
O Clubeonline procurou os presidentes de júri para comentar o ano, o 45º Anuário e o valor da Criatividade.
Nesta primeira rodada, publicamos as considerações de Laura Esteves, diretora executiva de criação da DPZ&T, e André Kassu, sócio e diretor de criação da CP+B.
Confira:
JULGAMENTO REMOTO EM ANO DE PANDEMIA
Laura Esteves – Vamos avaliar, agora em agosto, o trabalho produzido no segundo semestre de 2019 e primeiro de 2020. Até o final de março deste ano, nossa indústria seguiu o mesmo passo. Ou seja, mesmo com a pandemia, é possível enxergar um corpo de material suficiente para uma radiografia criativa do ano. E avaliar como os meses de quarentena serviram para nos deixar ainda mais criativos frente às adversidades. É possível que o impacto da pandemia possa ser refletido ainda mais nas peças do Anuário de 2021 do que esse ano. De qualquer maneira, estamos preparados para exercitar um olhar apropriado e contextualizado com nosso momento.
IMPORTÂNCIA DA CRIATIVIDADE
Laura - Faço parte da geração que se formou folheando o Anuário. Me lembro dos Anuários mais antigos, quando criatividade era um ator em um cenário dando o texto para a câmera. De lá pra cá, evoluímos muito em produção, craft e tecnologia. Mas, neste ano, a pandemia nos trouxe ao ‘back to basic’. E que lindo foi ver que, na necessidade, a criatividade sobreviveu e soube fazer o caminho de volta ao básico e à sua essência. Este ano, a Nike não consegue abrir a câmera para fazer mais um dos seus filmes épicos? Tudo bem. Edita-se material de cenas jornalísticas de arquivo. E essa se torna a peça recorde de views e compartilhamento da marca. Tirar o que é complementar e periférico apenas revelou o nosso core business: criatividade.
DESAFIOS DO MERCADO ANTES E PÓS-COVID-19
Laura - Os desafios que vivíamos pré-covid foram potencializados. Os acertos também. A crise apenas acentua e revela o nosso comportamento anterior. Mas, justamente neste momento desafiador para o mercado, a relevância de um parceiro de negócio e comunicação tem se provado cada vez maior. A comunicação pode ajudar a mudar o modelo de negócio da concorrência? Sim. Uma campanha de Dia dos Pais pode disparar o valor da ação de uma marca? Isso apenas para dar dois exemplos de clientes, em uma única semana, da DPZ&T, agência que tenho muita sorte de fazer parte. Como um cliente sabiamente nos disse em uma video call recente: é na adversidade que se provam as verdadeiras parcerias.
EM UM ANO COM FORTES MANIFESTAÇÕES, APESAR DA PANDEMIA, TEREMOS MAIS AÇÕES COM CAUSAS?
Laura - Assim esperamos. A comunicação tem a responsabilidade de cristalizar e amplificar manifestações sociais para que suas mensagens se perdurem quando as hashtags não estiverem mais nos feeds e nem as manifestações nas ruas. Torço também para que as iniciativas não se encerrem em belos manifestos desprovidos de entregas práticas. A fase da carta das intenções ficou lá atrás, em 2015.
JÚRI 50/50
Laura - Esse é um bom exemplo da intenção se tornando prática. É mais fácil discursar sobre a diversidade do que pesquisar, planilhar, equilibrar e montar um júri diverso. Dá trabalho e, como toda mudança, gera desconforto. Mas foi isso que nossa presidente fez. E a receptividade dos sócios foi muito positiva. Quanto mais representatividade tivermos no júri, mais ampla e real será a avaliação do júri.
JULGAMENTO REMOTO
André Kassu - O trabalho do júri ser remoto seria muito mais difícil se fosse no início da quarentena, quando estava todo mundo tentando se adaptar, tentando entender a melhor forma de se relacionar, qualquer que fosse a plataforma,
Zoom ou
Teams. E tinha mais ainda: administrar o tempo e todas demandas que se tem, a casa, e a própria ansiedade. Então, vejo esse
julgamento de modo mais tranquilo porque está todo mundo mais familiarizado com esses processos de trabalhar remotamente.
CATEGORIA EM ANÁLISE
Kassu - Em relação ao meu júri, que é de
técnica de texto, coincide com o
ano em que eu voltei a escrever. Por voltar a escrever, comecei a olhar mais atentamente para a
importância da palavra. Nunca a valorizei tanto.
Texto estava sendo tirado do júri de um
D&AD ou
Art Directors. Estavam tirando da categoria técnica, o que demonstra que
a redação tem sido, aos poucos, esquecida. A gente foi partindo para uma linguagem global e foi esquecendo que um
conceito nasce de uma associação de palavras. Temos dado menos importância para esse conjunto. Não se mede um texto por peso, se ele é grande, pequeno, médio.
Medimos pela qualidade e pela pertinência da criatividade no uso daquele texto em prol da peça.
IMPACTO DESTE ANO SOBRE O MERCADO
Kassu - Não faço muito adereço em torno de 2020. É um
ano terrível, duríssimo em vários aspectos. Pode-se tirar uma lição daqui, outra dali, mas é um ano duríssimo. E que
tem um impacto sobre o Clube. E esta é a
hora de o mercado relembrar que o Clube ajuda a contar a história da comunicação no Brasil. O
Clube se tornou maior do que o
Anuário, num movimento que a diretoria fez há alguns anos, desde o
Edu Lima. E desde a criação do novo
Festival do Clube - e anteriormente teve a
revista Pasta. Quando o
site do Clube foi lançado, ele ganhou mais relevância. Mas, com o
Festival, o
Clube começou a
abraçar assuntos e quebrar a bolha, saindo da coisa do criativo.
EXPECTATIVAS PARA O ANUÁRIO
Kassu - Sobre as campanhas desenvolvidas neste cenário, isso é
difícil. Eu reforço:
tenho expectativa que o mercado inscreva peças. Este ano é particularmente duro porque
não teremos a F/Nazca no
Anuário. Ou deve ter uma pequena sobra do trabalho da F/Nazca. Nesse sentido, é duro ver
uma das agências mais criativas do mercado ter sido extinta. No mesmo dia em que o
Fabio Fernandes saiu do mercado (
leia "De saída" e "O fim de uma história linda"), o
Gerry Graf saiu, nos EUA (
aqui). Então,
alguma coisa nesse modelo não parece muito correta quando você perde dois dos
maiores criativos de todos os tempos – e suas respectivas agências - ao mesmo tempo.
É um alerta.
CAMPANHAS ANTES E DEPOIS DA COVID-19
Kassu - Do que a gente tem visto, há
soluções criativas de baixo orçamento. O mercado está testando
novas formas de filmar – porque existe uma série de
restrições. Isso deve aparecer no
Anuário, mas a gente tem campanhas do momento anterior à pandemia. Vai ser interessante
ver o antes e o durante a pandemia e ver
o que mudou na concepção, desde a ideia até sua realização. Acho que isso vai ser visível neste
Anuário. Talvez isso deva ser sinalizado. O
Anuário estará composto de um cenário antes da pandemia e durante a pandemia, com todas as suas dificuldades de produção. Ele mostrará como a criatividade se comporta bem nos dois cenários.
IMPORTÂNCIA DA CRIATIVIDADE
Kassu - Quanto à criatividade, ela encontra nas crises os seus momentos. Quando os orçamentos somem, quando as soluções não são aquelas que dependem de um grande investimento, você tem de buscar
novas formas e é aí que você começa a ver mais intensamente
a importância de criatividade neste mercado. Parece uma bobagem falar disso, mas, quando você olha para o
ranking das agências, vê as que mais faturam e não necessariamente o que está em primeiro plano para elas é a criatividade. Das 50, talvez a uma porcentagem menor delas seja das que buscam soluções realmente criativas na sua concepção.
JÚRI 50/50
Kassu - A
montagem de um júri do
Clube sempre foi um assunto muito complexo. Lembro que, no começo, era por votação dos associados. Nos primeiros Anuários havia realmente uma seleção do mercado. Eram oito pessoas que julgavam. Teve uma mudança significativa quando o
Anuário saiu das categorias TV, rádio, outdoor e foi para
categorias de mercado. Foi uma mudança extremamente positiva, porque
trouxe relevância para os clientes. Eles entendem sobre a concorrência. Agora tem essa mudança, que era muito desejada pelo mercado. E que
encontrou nesta diretoria sua melhor forma para consolidá-la. Em um ano duro, a gente tem uma
renovação do júri. Nesse sentido, a gente está catando aprendizados. São sinais que a gente fica feliz em ver. E isso culmina com o
Anuário da
Keka Morelle (
veja aqui), que acho extremamente maduro em sua concepção. Gostaria de
valorizar também as mulheres que fazem o dia a dia do
Clube.
Saiba como inscrever peças no 45º Anuário aqui. Prazo segue aberto só até sexta, 14 de agosto. Dez primeiras inscrições são gratuitas para qualquer empresa.