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Cidades precisam de + verde

Na Semana de Design, Ricardo Cardim clama por flora nativa

13.03.25

O paisagista e botânico Ricardo Cardim é um dos nomes mais conhecidos do Brasil quando se trata de paisagismo com flora nativa. Ativo nas redes sociais, ele busca orientar a população a plantar o que é local, em vez de aderir a modas que são normalmente centradas em espécies de fora. Para Cardim, precisamos conhecer mais o que é típico das nossas cidades, abrir mais espaço para o verde e, assim, combatermos a mudança climática regional.

Cardim foi o consultor da exposição interativa “Sementes do Amanhã”, que faz parte da programação da DW, a Semana de Design de São Paulo. Aberta nesta quarta-feira, 12, ela mostra para os visitantes espécies botânicas da Serra da Cantareira, importante reserva de verde da capital paulista.

Instalado no Lar Center, o projeto foi criado pelo diretor de arte Flávio Sadalla, do Studio Sadalla, em parceria com o VJ Scan. O painel exibe elementos gráficos circulares que se iluminam enquanto a pessoa anda por uma passarela. Dentro deles, surgem sementes que evoluem para a planta formada. Assim, entram em foco espécies como copaíba, guaimbê e caliandra.

A escolha das espécies foi orientada por Cardim, responsável também pelo plano de recuperação de biomas que fará parte do projeto de desenvolvimento imobiliário Cidade Center Norte.

Ele fez uma apresentação na abertura da exposição interativa – que ficará aberta até o dia 23 de março. Ele contou a história do Brasil e de São Paulo pela ótica do paisagismo, explicando como as primeiras cidades costeiras foram construídas para se “defenderem” da natureza que assustava os europeus.

Com o tempo, o verde foi introduzido nos espaços urbanos, mas com plantas de fora, que se transformaram em invasoras. Hoje, as cidades brasileiras são terrenos áridos, com pouquíssimo verde, o que é um absurdo diante da riqueza que o país tem em termos de biodiversidade. Por isso, para combater a crise climática regional, é fundamental plantarmos mais as espécies nativas.

Na música se fala que são as águas de março que fecham o verão. Mas o que temos visto é que a seca que está fechando. O clima está mudando muito rapidamente. E essa é uma questão que diz respeito a todos nós. Diz respeito a este momento da humanidade”, afirmou o paisagista.

Cardim lembrou de uma capa da Veja de 1976, que trazia como manchete “Como viver em São Paulo”. Uma ilustração trazia um homem engravatado, com guarda-chuva, máscara anti-poluição, trânsito congestionado e água na altura dos tornozelos. “Há quase 50 anos já percebemos que moramos em cidades ruins”, comentou.

Segundo o paisagista, o Brasil é o país mais urbanizado do mundo, com mais de 87% da população vivendo em centros urbanos. No caso de São Paulo, a cidade cresceu sem deixar áreas livres para o verde. Na metrópole paulistana, temos apenas 2,6 metros quadrados de área verde pública de lazer por habitante.

E, com isso, se formam as ilhas de calor.

A mídia aborda muito o impacto do aquecimento sobre as geleiras ou outras situações globais, porém fala bem menos sobre as mudanças climáticas regionais provocadas pela falta de verde. Para Cardim, ainda está na nossa mão reverter esse cenário, desde que saibamos escolher políticas e políticos comprometidos com esse tema.

Uma foto aérea exibida por Cardim mostrou a diferença brutal entre São Paulo e Berlim. É verdade que os tamanhos das populações são bem díspares – aqui, 22 milhões; lá, 6 milhões. Mas há muito verde visto do alto, enquanto a capital paulista é uma imensa mancha cinza. Berlim, desse modo, é mais resiliente do que São Paulo.

Soluções arquitetônicas existem. Alternativas para o uso do espaço público também, como na Alemanha, em que espaços reservados para estacionamento dos carros nas ruas foram substituídos por canteiros de árvores. Elas não estão postas na calçada. Estão nos lugares de carros. “O verde não é caro e São Paulo não é pobre”, observou Cardim.

Outro ponto importante é a biodiversidade. Em apenas mil metros quadrados de Mata Atlântica é possível encontrar 144 espécies. Em 5% das florestas europeias, o total de espécies é seis. E ainda assim 90% do paisagismo no Brasil é feito com plantas que não pertencem aos nossos biomas. “A gente se comporta como se fosse um país de deserto”, critica o especialista. Ele pontuou que das 20 frutas mais produzidas aqui, somente duas são brasileiras.

Para mudar esse cenário, é necessário investir em educação, em informação. Como ele disse, vivemos uma erosão cultural severa. Se ampliarmos a conscientização, se tratarmos do paisagismo com responsabilidade e envolvendo times multidisciplinares, se plantarmos mais nossas espécies, poderemos ter em dez anos a São Paulo da garoa de novo. Porque hoje temos a São Paulo das tempestades.

#ClubedeCriação50Anos

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