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Consciência Negra 1

Com Ana Carneiro (Estúdio Nina)

21.11.22

O Clubeonline procurou profissionais do mercado para analisarem o que mudou na indústria da comunicação em relação à inclusão, ao combate à invisibilidade e ao racismo. Por conta do Dia da Consciência Negra, 20 de novembro, diversas empresas e marcas procuram promover ações e reflexões sobre o tema. Mas o quanto de fato avançamos?

Ao longo desta semana vamos publicar respostas a quatro perguntas que fizemos para esta série. A primeira entrevistada é Ana Carla Carneiro, sócia-fundadora do Estúdio Nina, empresa de pesquisa de mercado e comunicação que tem como objetivo aumentar a representatividade da população negra na comunicação brasileira.

Clubeonline - Na sua opinião, há mudanças de fato perceptíveis acontecendo no mercado de comunicação no Brasil, no que tange à inclusão, combate à invisibilidade e ao racismo?

Ana Carneiro - Sem dúvida o cenário mudou. Há alguns anos essa discussão sobre raça não existia. Não existia qualquer preocupação em relação às questões raciais. Hoje vemos que todo o mercado fala a respeito desse assunto. Mas as mudanças são muito lentas e muito mais presentes no discurso do que na prática. Vemos muitos profissionais e lideranças desse mercado falando sobre a representatividade de forma realmente genuína. O que falta é a ação. As marcas conhecem muito pouco o público negro, tem muito caminho a ser percorrido nesse sentido – pensando em desenvolvimento de produtos, em comunicação e mesmo em questões como distribuição e posicionamento de preços. As marcas que estão à frente são as marcas de beleza – exatamente porque têm produtos específicos para pele ou cabelo de pessoas negras e vêm sofrendo muito mais pressão dos seus consumidores. Mas há muita dificuldade de outros segmentos entenderem que ser negro ou branco define necessidades que são distintas. Pensando nas propagandas, o que vemos ainda é uma preocupação centrada em cumprir uma 'cota racial' nos anúncios, mas falta ainda retratar a vida das pessoas negras, suas realidades para assim se conectar de fato com esse público.

Clubeonline - Você participa ou conhece iniciativas com foco no antirracismo cujo trabalho venha fazendo diferença no nosso mercado?

Ana - Fundamos o Estúdio Nina em 2019 para isso. Somos uma empresa de pesquisa e consultoria focada no entendimento do público negro. Acreditamos que isso é essencial – que a questão racial é a principal questão a ser resolvida e que não pode ser tratada dentro de uma chave de 'diversidade'. Temos muito orgulho de alguns trabalhos que já realizamos com nossos clientes. Em setembro a L’Oréal aboliu a denominação “morena” e “morena mais” de todas as suas linhas de protetores solar com cor (de todas as marcas). Isso pode parecer pouco, mas é muita coisa! Chamar uma mulher preta de morena é extremamente ofensivo e uma forma de branquear essas mulheres. Temos também visto que as Sondagens Racistas, uma metodologia nossa para testar campanhas e peças publicitárias eliminando elementos racistas, ofensivos e sensíveis, têm trazido muitos resultados positivos. As agências já começam a ser capazes de ter um olhar muito mais crítico e letrado sobre suas produções, evitando que muitos estereótipos sejam reforçados no dia-a-dia.

Clubeonline - Com relação ao Brasil em 2023, quais suas expectativas sob o prisma da inclusão, igualdade racial e diversidade?

Ana - Tem uma frase que falo sempre que é 'o que a gente vê, não tem como a gente desver'. Com relação à igualdade racial é sem dúvida um caminho sem volta. Nenhuma marca, nenhuma agência, nenhum veículo pode parar de olhar para essa questão, de desenvolver iniciativas que de fato impactam seu trabalho. Além disso, os negros são a maioria da população brasileira. O mercado não tem como não atender mais suas expectativas. Os consumidores negros não vão se calar e vão continuar cobrando das marcas. E as empresas vêm tomando consciência que estão perdendo dinheiro ao não se conectar com a maioria dos brasileiros.

Clubeonline - Poderia indicar um bom livro, ligado à questão racial, aos internautas que nos acompanham?

Ana - Olhares Negros: Raça e Representação, da Bell Hooks. Ela nos faz refletir sobre o tipo de imagem que geramos e consumimos, e quais são as práticas políticas que delas derivam.

Consciência Negra 1

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