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Escaninho do Washington

Uma entrevista ao Clio

10.04.14


Como vocês já devem ter lido aqui mesmo, no site do CCSP, acabo de ganhar o Clio Lifetime Achiviement 2014. Fiquei feliz. A homenagem acontece só no próximo dia 1° de outubro, durante a Advertising Week, de Nova York, mas para quem quiser ler trechos da entrevista que acabo de dar aos organizadores do evento, aí vão alguns deles, ainda sem edição e em português.



Clio. Sua lista de elogios da indústria é algo notório. O que significa ser nomeado para o Clios’ Lifetime honor?



WO. A vida tem sido muito generosa comigo. Tive a sorte de começar em publicidade muito cedo, aos 19 anos de idade, quando a geração anterior a minha já havia profissionalizado a publicidade brasileira, criando condições favoráveis para o surgimento de um jovem com as minhas ambições. Desde o início, fui diversas vezes o primeiro ganhador da maior parte dos prêmios, internacionais e nacionais. Ganhei, por exemplo, o primeiro Leão de Ouro do Brasil, no Festival do Cinema Publicitário de Cannes, e o primeiro Profissionais do Ano, da Rede Globo de Televisão. Essa distinção que recebo agora do Clio evidentemente me deixa honrado e orgulhoso. Pelos nomes que receberam anteriormente essa homenagem e porque existem muitos outros magníficos profissionais que mereceriam essa mesma honraria.



Clio. A interligação mundial permite que qualquer trabalho desenvolvido para o Brasil chegue a Berlim em questão de segundos. Isso é ruim ou bom para as marcas, particularmente aquelas com presença internacional? O que significa para os criativos locais no âmbito global?



WO. Isso é bom para diversas marcas e extremamente excitante. Mas, algumas vezes, essa realidade acaba fazendo com que a comunicação perca a sua cor local e sofra um processo de pasteurização. Os criativos precisam analisar caso a caso e nunca esquecer de que, muitas vezes, a melhor maneira de ser absolutamente internacional é ser fortemente local.



Clio. Quais são as coisas mais interessantes que você está vendo no negócio, local e internacionalmente? De curto e de longo prazo, quais são as tendências? Oportunidades? Desafios?



WO. Me encanta a revalorização do texto na publicidade. Me encanta a interligação das mídias e o fato de ninguém mais ser analógico ou digital. Todos serem tudo ao mesmo tempo. Não gosto da palavra tendência: costumo brincar dizendo que ela foi inventada para emprestar certa dignidade ao gesto da imitação.



Clio. Videos de conteúdo de marca são cada vez mais utilizados. Quais são as oportunidades e, se houver, os inconvenientes para a contemporânea prática do casamento de conteúdo com uma mensagem comercial?



WO. Sempre fui um produtor de conteúdo, bem antes da palavra conteúdo entrar na moda. Assim como sempre fui um contador de histórias. Usei música popular na propaganda, criei comerciais que funcionavam como séries, gerei patrocínios de equipes de futebol quando eles ainda não existiam. Gosto do casamento da publicidade com a cultura pop em geral: com o cinema, com a televisão, com a música popular, com o teatro, com as artes plásticas e com todas as outras possibilidade da era digital.



Clio .Versatilidade, continuidade e, talvez, reinvenção constante são aparentemente os temas dominantes de sua carreira. O que você procura em um jovem criativo e que conselho você daria aos jovens criativos que procuram seguir seus passos?



WO. Sim. Minha obsessão sempre foi, e continua sendo, fazer o novo de novo. Em 2010, quando criei a ideia do casamento da W/Brasil com a McCann, que gerou a WMcCann, dei uma entrevista dizendo que uma das coisas que me fascinava na fusão era a possibilidade de criar coisas novas para mostrar para os meus filhos. Na época, o meu casal de gêmeos estava com 6 anos de idade, e eu rejeitava a ideia de ficar contando para eles sobre o meu passado profissional. Prefiro sempre falar do presente. Quando busco jovens criativos, busco gente que se interesse pela vida em geral e não apenas pela publicidade em particular. Bons criativos são historicamente extremamente curiosos e ávidos consumidores de vida, em todos os seus aspectos e nuances.



Clio. Você é mais do que um anúncio criativo no Brasil, você é um ícone da cultura brasileira - comemorado e celebrado em canções, filmes, Carnaval e até mesmo na culinária. Por que a publicidade é tão transcendente no Brasil? Por que o entusiasmo do público com a publicidade como uma forma de arte é tão febril? E para além do óbvio, quais são as desvantagens para a celebridade?



WO. Um dos maiores patrimônios do Brasil é o fenômeno da miscigenação, da mistura de raças. Isso gerou um povo romântico, sensual, musical, alegre, sexy e bem humorado. Muito receptivo à publicidade de boa qualidade, a publicidade que contem componentes emocionais. Devido a esses fatores, é bom e gratificante ser publicitário no Brasil, e, realmente, os níveis de reconhecimento que temos são atípicos. Acredito que só no Brasil e na Inglaterra publicitários se transformam em figuras conhecidas do grande publico. Comentei isso anos atrás com meu amigo John Hegarty, que concordou. As vantagens de ser conhecido e reconhecido são muitas, porque em geral as pessoas são extremamente carinhosas. Tão carinhosas que nos fazem esquecer as eventuais desvantagens e incômodos que vez por outra a fama oferece.



Clio. Os próximos anos serão grandes anos para o esporte no Brasil. Quais são as suas maiores esperanças para o país na Copa do Mundo deste ano?



WO. Uma Copa do Mundo significa uma foto do país sede sendo vista por toda a humanidade. Eu espero que o Brasil saia bonito nessa foto.



Clio. Quais trabalhos que você mais espera ver com a chegada da Copa do Mundo? O que, para você, foram alguns dos pontos mais memoráveis dos jogos olímpicos de inverno deste ano?



WO. Tenho muita curiosidade em ver os trabalhos de guerrilha que certamente anunciantes não diretamente ligados aos patrocínios oficiais vão fazer durante a Copa do Mundo. Já os Jogos Olímpicos de Inverno tiveram diversos momentos marcantes. O empate no downhill femino, com a suíça Dominique Gisin e a eslovena Tina Maze dividindo a medalha de ouro, foi sensacional. A falha no efeito especial na cerimonia de abertura, repetida propositalmente com grande senso de humor na cerimônia de encerramento, foi ótima. E a virada do time feminino de hoquei do Canadá sobre o time dos EUA foi histórica.



Clio. Você tem um mentor? Se sim, quem? E qual foi o melhor conselho que ele ou ela já lhe deu?



WO. Na publicidade, meu grande mestre foi Francesc Petit, sócio fundador da DPZ, agência brasileira onde eu tive o privilégio de trabalhar por 14 anos. Petit e eu formamos uma dupla até hoje considerada a melhor da publicidade brasileira. Na vida, tenho outros dois grandes mestres e queridos amigos: José Bonifácio de Oliveira Sobrinho, o Boni, maior nome da televisão brasileira, criador do padrão Globo de qualidade. E André Midani, figura lendária da produção musical, que lançou entre outras coisas a Bossa Nova e o Tropicalismo.



Clio. Este é o primeiro Clio com um júri masculino-feminino uniformemente dividido. Como é que o ambiente mudou, na sua opinião, na América Latina e em outros lugares, para profissionais de criação do sexo feminino?



WO. A notícia é ótima. Ambientes que misturam homens e mulheres são sempre mais agradáveis. E a notícia corresponde a realidade: nos últimos anos, a presença feminina é cada vez mais poderosa no marketing e na publicidade. Isso está acontecendo no mundo inteiro e não poderia ser diferente no Brasil.



Clio. Com quem, entre os seus pares de criação global - marketing, entretenimento e mídia - você não trabalhou, mas gostaria de trabalhar?



WO. A melhor coisa que o sucesso profissional pode nos dar é a possibilidade de ficar amigo dos nossos ídolos.

Sou amigo de profissionais que sempre admirei, no Brasil e no mundo. Com alguns tive o privilégio de trabalhar. Com outros, apenas cultivo a amizade. Dos grandes que não conheço pessoalmente no universo da comunicação, me encanta a figura do Martin Scorsese. Adoraria fazer algum trabalho com ele.



Clio. Graças à Copa do Mundo, Liga dos Campeões, e maior visibilidade de ligas como a Barclays Premier League, Ligue 1 e La Liga, os americanos estão se tornando mais próximos ao futebol e tratando-o como um produto. Você, como vice-presidente de marketing, uma vez, no Corinthians, e arquiteto da Democracia Corintiana, que esperanças e expectativas para da Seleção brasileira tem? Como a mídia e o marketing, sobretudo tendo em conta a tecnologia digital e mobile, mudam o jogo?



WO. Quando eu fui vice-presidente de marketing do Corinthians trabalhar o futebol como produto no Brasil era uma absoluta novidade, e a Democracia Corintiana ficou famosa por causa disso. Naquele momento, tínhamos uma bandeira política que despertava a simpatia de todos. O Corinthians da Democracia Corintiana era futebol, mas não era só futebol. A equipe estava também engajada na luta pela volta das eleições diretas, um sonho de todos os brasileiros. De lá pra cá, o futebol no mundo inteiro se profissionalizou ao extremo e as coisas mudaram muito. Surgiu a geração de jogadores que eu apelidei de futpopbolistas, uma mistura do futebolista com o ídolo pop. Hoje, como a seleção brasileira é composta de futpopbolistas que atuam em diferentes equipes do exterior, a identificação dos brasileiros com a seleção é menor do que antigamente, quando os nossos grandes craques jogavam aqui e participavam do nosso cotidiano. Mas o futebol, em geral, como negócio, está cada vez mais próspero, gerando oportunidades em todas as mídias. Nisso se inclui o meu Corinthians, que foi campeão mundial em 2012, ganhando do Chelsea, e é hoje considerado um fenômeno de prosperidade econômica e financeira. Uma matéria da revista New Yorker, publicada na segunda semana de janeiro de 2014, analisa bem as qualidades e defeitos do futebol brasileiro, em geral, as perspectivas da Copa e o fenômeno Corinthians. Recomendo a leitura.



Clio. Publicidade nativa - publicidade que integra conteúdo editorial com mensagem comercial, particularmente no contexto digital - é uma tendência nos Estados Unidos. Como a interação entre mídia e publicidade mudaram na América Latina? Será que a mídia se tornou parte mais integrante do processo criativo?



WO. Sim. A mídia é cada vez mais integrante do processo criativo, apesar de, historicamente, os melhores profissionais e as melhores agências sempre terem buscado e praticado essa integração. O que acontece hoje é que esse processo está mais generalizado.



Clio. Se existisse uma comida ou um prato nos EUA em sua homenagem, qual seria?



WO. Uma carne do Peter Luger, um peixe do Milos Estiatório ou um hamburguer com aligot do Minetta Tavern.



Leia texto anterior do Escaninho aqui.

 


Escaninho do Washington

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