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Fuja do 'healthwashing' focando no propósito das pessoas
O tema "healthwashing" talvez ainda não esteja tão difundido mundo afora, mas seus efeitos já estão sendo sentidos pelos quatro cantos do planeta. Assim como lá pelos anos 1980 as empresas começaram a usar a pauta verde para atrair consumidores por meio do "greenwashing", hoje as marcas se apropriam do discurso da saúde para vender. Pelo menos é o que elas tentam. A diferença é que nos anos 2020 as pessoas estão mais atentas e não acreditam em tudo que as marcas propagam.
É sobre isso que Bernardo Romero, maker da Klick Health, agência de publicidade canadense voltada para a área de saúde, falou em sua palestra no sábado (23) no Festival do Clube de Criação. De acordo com o criativo, as marcas foram perdendo credibilidade com o tempo, a partir do momento em que o discurso que propagavam não correspondia à realidade dos produtos que vendiam.
"Em 1986, um ativista em Nova York descobriu que o discurso de uma rede de hotéis americana tentando convencer os hóspedes a não usarem mais toalhas durante a estadia estava, na verdade, ligado ao fato de que eles queriam economizar dinheiro e não à pauta do meio ambiente", disse. E, segundo Bernardo, essa tendência permaneceu por décadas. "Como vimos nos noticiários da época, em 2015, o CEO da Volkswagen caiu quando descobriram alterações nos resultados dos testes de emissões de CO2. Isso foi terrível para a marca", contou. Bernardo citou ainda o caso bastante difundido na imprensa da Starbucks, que mudou a tampinha de plástico conectada a um canudo por uma tampa verde, alegando ser uma solução para usar menos plástico. Porém, rapidamente foi descoberto que essa solução usava 2,3 vezes mais plástico que a anterior.
Como hoje em dia a pauta da saúde está em alta, Bernardo afirmou que este movimento se expandiu para essa área, com as mesmas características. A diferença, segundo ele, é que o perfil do consumidor de hoje é diferente.
Segundo Bernardo, a indústria vive hoje uma enorme crise de falta de confiança. "As pessoas não confiam mais em marcas: 42% dos jovens da geração Z não acreditam em nenhuma marca (Insider Intelligence); 88% não acreditam em mensagens 'eco-friendly' (McKinsey & Company) e 33% confiam mais no TikTok que em médicos (Forbes)", afirmou.
Em seguida, Bernardo disse que ainda dá tempo de recuperar a confiança das pessoas, evitando as armadilhas do "healthwashing", e indicou o caminho. "É preciso mudar o foco: do propósito da marca para o propósito das pessoas", definiu. De acordo com ele, se as pessoas percebem que o propósito da marca é vender, elas não acreditam. "A pergunta deve ser: como eu posso te ajudar a realizar o seu propósito?", explicou. Mas como fazer isso? Segundo Bernardo, há três maneiras: inspirando, incentivando e viabilizando.
Para explicar melhor estes caminhos, Bernardo apresentou exemplos de marcas que utilizaram estas estratégias. No caso da inspiração, ele contrastou as campanhas de Always, "#Like a Girl" (assista abaixo), que viralizou no mundo todo e mudou muita coisa na discussão sobre a pauta feminista, com a do McDonald's, nada inspiradora, que apenas inverteu o "M" de seu símbolo para "W", para celebrar o "Dia das Mulheres". Pior: soube-se que muitas mulheres que trabalhavam no McDonald’s não tinham condições de sustentar seus filhos e viviam em situação de rua e que praticamente não havia mulheres em cargos de gerência na empresa.
Sobre incentivar, Bernardo trouxe o exemplo da Discovery, um tipo de plano de saúde que existe nos Estados Unidos. "A ideia não é nova, mas eles dão pontos para clientes que se exercitam, que cuidam da sua saúde. Quanto mais o cliente faz isso, menos a empresa cobra dele", contou. "É bacana para a empresa como business, porque eles pagam menos contas hospitalares e, do outro lado, a pessoa se sente incentivada pela marca", explicou.
Outro exemplo de incentivo foi o "The Get Up Alarm Clock", um trabalho que Bernardo fez antes de entrar na Klick Health para uma marca voltada ao tratamento de câncer. "Alguns pacientes já se sentiam desestimulados e desinteressados pela vida. Criamos um despertador que se conectava a toda a rede de apoio do paciente, que quando tocava trazia mensagens positivas e encorajadoras dessas pessoas para quem estava doente", contou. “É a marca incentivando e dando ferramentas para as pessoas seguirem o propósito delas e não o da marca", disse.
Ao falar sobre viabilizar, Bernardo trouxe o exemplo da Boost Mobile, marca de telefonia móvel nos EUA que atende principalmente população mais periférica. O executivo contou que eles acreditaram que a melhor maneira de ajudar a melhorar a vida daquelas pessoas era facilitando o acesso delas ao voto. A empresa conseguiu mais que quintuplicar o acesso ao voto daquela população e isso mudou completamente o cenário político dos EUA nessa última eleição. "Isso aconteceu por causa de uma marca que ao invés de dizer 'eu, marca, vou salvar o mundo', disse: 'eu vou te dar a oportunidade de salvar o seu mundo, do jeito que você quer'", explicou.
Ainda sobre viabilização, Bernardo trouxe o case de um cliente da própria Klick Health. O cliente, no caso, era o maior congresso de cirurgiões do mundo. A agência descobriu que mortes em salas de cirurgia são a terceira causa de mortes no mundo. Junto com um professor ligado à Klick, eles descobriram que um certo tipo de música, quando tocado em salas de cirurgia, pode ajudar a melhorar em 5% a firmeza e a precisão do movimento dos médicos. "Imaginem em uma escala global quantas vidas podem estar se salvando", comentou. "Essa ideia hoje é uma ferramenta usada por mais de 9 mil médicos no mundo inteiro, mas o que mais importa é que estamos dando uma ferramenta para estes médicos serem mais bem sucedidos no seu dia a dia profissional", completou.
Ao final, Bernardo concluiu com a seguinte proposta: "Para não cair nas armadilhas do 'healthwashing', pensem no propósito das pessoas em cada briefing. Ou seja, o que a sua marca pode fazer pelo público e não o que o público pode fazer pela sua marca".
Marcia Melsohn
11º Festival do Clube de Criação
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