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Festival do Clube 2024

Os elementos fundamentais para construção de roteiros

13.10.24

Uma aula sobre o processo criativo dos roteiristas aconteceu no palco do auditório Simón Bolívar, no Memorial da América Latina, neste sábado, 12, primeiro dia do 12º Festival do Clube de Criação. O painel “Da tela em branco ao texto na tela” reuniu cinco mestres: Caito Mainier (diretor artístico do Porta dos Fundos e diretor geral e chefe de roteiro do "Lady Night"); Luh Maza (roteirista de “Sessão de Terapia” e diretora de "Da Ponte Pra Lá"); Renata Andrade (autora-roteirista do “Zorra”, “Escolinha do Professor Raimundo” e da série “Encantado's”), Thiago Dottori (roteirista dos longas “Trago Comigo”, “A Suspeita” “Turma da Mônica Lições” e “Turma da Mônica Laços”, da série “Os Outros” e coautor da série “Psi”) e Lusa Silvestre (escritor, redator publicitário e roteirista de “Estômago”, “Estômago 2”, “Medida Provisória” e “Sequestro do Voo 375”. Eles ensinaram que, nesse trabalho árduo da arte de rescrever na era da Inteligência Artificial, o que faz a diferença é uma boa história escrita com paixão.

Poucos lugares no Brasil e no mundo teriam uma sala de roteiristas como essa aqui. Então, aproveitem ao máximo. E saibam que escrever um roteiro é um trabalho de Sísifo. Aqui, vamos conhecer como é o processo de criação de cada um deles, e desmistificá-lo um pouco”, afirmou Lusa, mediador da mesa, referindo-se ao mito em que Sísifo é condenado a rolar uma rocha grande montanha acima.

Caito contou que é um anotador contumaz. Está sempre atento a uma boa frase, a um bom personagem aonde quer que esteja, e vai anotando tudo no celular. No Porta faz um trabalho compartilhado, usam o Google Docs e escrevem juntos e ao mesmo tempo entre seis e oito roteiristas. “Uma vez que você tem a matéria-prima começa a lapidação, e, no final, não dá para saber quem escreveu o quê”, explicou.

O roteiro de Lady Night – do qual fez 150 episódios - é um trabalho de criação coletiva com a apresentadora. “Como a Tatá (Werneck) fala muito rápido, eu gravo tudo e depois transcrevo”, disse.

Para o Vrau Cast, podcast zueira de humor do Porta dos Fundos, Caito revelou que a ideia era fazer nesse oceano de fake news, um programa de entrevistas que os apresentadores seriam personagens idiotas, mas que as respostas dos especialistas trariam a verdade à tona. “A gente avisa para o convidado que, assim que começar a gravar, nós vamos virar dois idiotas, mas que as perguntas foram feitas exatamente dentro de um senso comum, ou de uma desinformação, ou de uma fake news, para o convidado responder o que considera importante, como especialista. É como se você estivesse sendo entrevistado pela caixa de comentários da internet. E que os entrevistados não são contra o entrevistado, mas contra o tema”, contou. Entre os episódios, Caito destacou a entrevista com o pediatra Daniel Becker, que eles disseram que apanharam quando criança e tudo bem.

Lusa comparou o processo criativo de Caito com pular corda em grupo, quando duas pessoas batem a corda e as outras têm de entrar. “É você tentando entrar na sala de roteiro, onde todo mundo é legal. O problema é quando você está aprovando a versão 3 do primeiro episódio, mandando a versão 2 do segundo”, exemplificou.

Oficina de roteiristas

Renata é publicitária de formação e fez a transição de carreira em 2018, quando foi chamada para a oficina de roteiristas da Globo. O roteiro de “Encantado’s” nasceu exatamente nesse curso.

No final da oficina, os participantes tinham de apresentar um projeto. “A gente queria falar de algo que fosse identificado. Queria ver minha mãe, queria ver meu pai, queria ver as pessoas no nosso entorno na série. Então, quando criamos aqueles personagens pensamos muito nas camadas, os pontos positivos, os pontos negativos, exploramos muito as questões humanas para que a série tivesse um alcance que justificasse a permanência dela. E deu certo: estamos agora gravando a terceira temporada”, celebrou.

Para Renata, o que funciona são as reuniões online com os outros criadores. “Trazemos todas as ideias e entendemos a temporada de uma série. Enxergamos a temporada, como aquela temática vai desenvolver ao longo de 11 ou 12 episódios, e de que maneira a gente vai trabalhar a dinâmica dos personagens. Esse processo é coletivo é muito rico. A gente debate muito, são horas entendendo. Às vezes, a gente precisa desmontar uma coisa que tínhamos criado porque não está funcionando, porque a história não estava mais falando como a gente gostaria. A gente usa muito das reuniões para debater e para entender”, esclareceu. Depois, separam o que cada um vai escrever e começa o processo solitário. Em seguida, é a vez de ler em voz alta. “Ouvir o roteiro faz muita diferença e a leitura com o elenco é fundamental”, acrescentou.

Teatro e audiovisual

Luh Maza é a primeira roteirista trans da televisão brasileira. Começou a atuar aos 12 anos, e aos 16 já havia escrito sua primeira peça. Dona de uma poética singular, Luh sempre soube o que queria fazer profissionalmente: contar histórias com sua visão de mundo.Construí a minha carreira no teatro muito voltada à pesquisa de dramaturgia, à dramaturgia contemporânea, à formação de novas dramaturgia no Rio de Janeiro, que é a minha cidade natal", contou.

Trafegando muito bem no teatro e no audiovisual, Luh consegue enxergar onde uma história se encaixaria melhor. “Eu vejo as profundas diferenças entre os dois segmentos, vejo quando uma coisa vai muito bem no teatro, ou quando só conseguirá alcançar isso exatamente no audiovisual, com a possibilidade da imagem sublimando a fala. Então, a partir de cada ideia, eu entendo naturalmente que ela funciona para um desses dispositivos”, sinalizou.

O arquiteto e o jardineiro

Thiago Dottori também iniciou na publicidade e iniciou no cinema em 1997 e tem processos distintos para cada um dos projetos. “'Psi' fui eu e um psiquiatra bem conhecido que já faleceu, Contardo Calligaris. Ele queria só alguém que tivesse experiência e só nós dois juntos”, lembrou.

Comecei na publicidade, desesperado para fazer cinema, mas não tinha cinema naquela época. Eu meio que topava fazer qualquer coisa para ter o direito a oportunidade de fazer cinema”, confessou.

Para ele, o peso dos personagens e da história nos roteiros é o mesmo, mas há uma diferença na estrutura. No cinema, ele é mais obcecado com a estrutura, com a escaleta, ferramenta de construção de roteiros que serve para organizar a ordem das cenas e o ritmo do filme. “Na série, você sempre tenta a longevidade, as pessoas voltam por causa dos personagens, você tem de pensar qual é o motor do personagem, qual o eixo, qual o dilema?”, indagou. E deu uma preciosa dica: “É muito legal você imaginar que o personagem tenha sempre dois desejos que são inconciliáveis, como em ‘Breaking Bad’, série na qual o protagonista tem o desejo da família e ao mesmo tempo de ser o criminoso. Quando um tá bom, o outro não vai estar. Nesse motor você vai brincando de um lado para o outro e consegue construir uma longevidade muito grande”.

Já em “Os Outros”, criado por Lucas Paraízo – que também se apresentará no Festival (leia mais aqui) –, o trabalho dos roteiristas foi dividido pelos personagens. Thiago ficou com Wando. “Ele era um personagem que ninguém gostava, mas esses caras são como os meus amigos da infância, do lugar em que cresci. Eu consegui olhar para aquele cara com um certo coração, com um certo carinho”, disse Thiago, que escreveu 18 capítulos da primeira temporada.

Ele finalizou com mais uma dica para roteiro de cinema ou de série. Primeiro passo é escrever uma sinopse de uma página e meia a duas na qual você desenha a história do protagonista. O segundo é transformar essa sinopse numa prosa de 10 páginas, um argumento. O terceiro passo é pegar esse argumento e começar desenrolar o que vai ser um roteiro de um longa, com 90 páginas.

Thiago fez ainda referência a George Martin, escritor de “Game Of Thrones”, que defende que há dois tipos de escritores: arquiteto e jardineiro: “O arquiteto é o que planeja tudo, tem uma visão macro desde o começo e, depois, ele vai escrevendo cena a cena, mais ou menos cumprindo o destino daquilo que está na escaleta. O jardineiro vai plantando os personagens no jardim e aquelas plantas vão crescendo, vão ganhando forma enquanto você escreve”.

Silvia Herrera

Serviço:

12º Festival do Clube de Criação - 12 e 13 de outubro - sábado e domingo - das 8h30 às 22h

Ingressos estão à venda na plataforma da Sympla (aqui). Garanta o seu.

Dúvidas ou desejo de se associar? clubedecriacao@clubedecriacao.com.br ou Whatsapp do Clube: 11 - 93704-2881

Endereço Memorial: Av. Mário de Andrade, 664 - Barra Funda

Acesso pelo Metrô Barra Funda

Estacionamento no local

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