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Debate desconstrói etarismo e associa longevidade e revolução
O painel “Como combater o etarismo dentro e fora das telas”, que aconteceu durante o 12º Festival do Clube de Criação, reuniu um time feminino poderosíssimo: a atriz e estilista Claudia di Moura, Fernanda Peka (associate creative director da Grey), Rita Almeida (head de estratégia da AlmapBBDO), Vivian Gomes (head de marketing da Renner) e Lara Magalhães (sócia do Coletivo 45+), que fez a mediação do painel.
Elas fizeram uma avaliação do preconceito em relação à idade, também levando em consideração as interseccionalidades de raça e gênero neste horizonte. Lara abriu as discussões dizendo que ficou muito feliz, ao verificar que era uma mesa 100% feminina. “Nesse painel vamos debater o etarismo como preconceito com os mais velhos”, explicou, antes de apresentar todas as convidadas e dar a palavra a Claudia.
A atriz, com 40 anos de carreira e prestes a completar 60 anos, frisou que 56% da população brasileira se declaram pretas e pardas. São consumidores que movimentam R$ 1,7 trilhão (segundo o Instituto Locomotiva). Diante disso, fez uma provocação: "por que é sempre uma branca que anuncia os produtos?" Claudia, de ascendência afro e indígena, contou que seu pai tinha medo de envelhecer. “Meu pai me dizia que queria morrer jovem porque o país onde é necessário ter um estatuto do idoso não é de confiança”.
Invisibilidade
Claudia destacou que, no Brasil, as pretas já nascem velhas, porque lhes é roubada a infância, e na adolescência já são invisibilizadas. “E, quando chegamos aos 40 anos, já precisamos vestir a fantasia da Tia Nastácia, aquela que não tem desejos, prazeres, vontades, ou beleza. É uma crueldade, é um impacto muito sério na vida da mulher preta, da artista preta”, afirmou.
Em seguida, Fernanda, que tem 37 anos, avaliou que essa invisibilidade atinge toda uma faixa etária, mas isso ocorre de forma mais impactante sobre o gênero feminino. “Sinto, no dia a dia, que existe uma faixa etária entre os 45/ 65 anos que é invisível, principalmente a mulher, como se nenhum produto fosse destinado para ela. E isso é um absurdo gigantesco”, disparou. Para ela, é papel, sim, dos publicitários tentar trazer à luz essa mulher, que tem poder de decisão e poder de compra.
Liberdade
Sob a ótica das marcas, Vivian Gomes explicou que a proposta da companhia não é falar de etarismo nas suas campanhas, mas de energia, de autoconfiança, de bem-estar, de autoestima, independentemente da idade.
“A Renner vai fazer 60 anos em 2025 e grande parte da nossa base de clientes tem 40 anos ou mais", ressaltou. "Nossa marca tem uma alma feminina, e precisamos falar de diversidade, de respeito com as mulheres de todas as faixas etárias. Não podemos nos dar ao luxo de falar com uma fatia de uma determinada idade. A gente precisa abordar, sim, a questão da liberdade, de ser quem se é", avaliou. "O ponto é como trazer a moda para um lugar de ferramenta de expressão, de individualidade. Acho que isso é uma responsabilidade muito grande. Não é porque tenho 40, 50, 60 anos, que eu preciso me vestir ou não de uma determinada forma”, completou.
Para ilustrar os passos da companhia nessa direção, a executiva citou uma série que estão fazendo com o GNT, “Toda Brasileira Tem” (leia aqui), na qual estão mostrando histórias reais de mulheres empoderadas em todo país. “O primeiro episódio se chama ‘Feminista’. É a história de uma carioca de 54 anos, a Josélia, uma mulher negra que começou a carreira de modelo aos 50 anos", disse. E, dentro dessa perspectiva, a marca também realizou a campanha "Liberdade Feminina dos 8 aos 80’" (assista abaixo).
Troca entre gerações
Rita Almeida trouxe um alento. Por sugestão dela, a agência fez um estudo de comportamento sobre longevidade. Indo a campo, todos os estereótipos da terceira idade foram sendo desconstruídos.
“Chama-se a 'Revolução da Longevidade' porque tem muita coisa que precisa mudar. Eu sou especialista em estudo de comportamento e quis estudar esse assunto porque ele é muito cheio de preconceito, desentendimentos e equívocos. E sempre começo meus estudos na rua. Chegamos com a cabeça que todo mundo tem sobre a longevidade. Vamos falar com uma galera mais devagar, já estabilizada. E não era nada do que a gente pensava", destacou. "Foi impactante, revelou um envelhecer muito mais ativo, com muito sonhos, com vontade de fazer, com capacidade de se reinventar, pessoas namorando e com muita libido”, ressaltou.
Rita fez um convite aos presentes: que vejam a pirâmide etária virada de cabeça para baixo. “Que a gente vire e também nossa cabeça”, desafiou.
Claudia concordou: “O interessante é que nós somos 31 milhões de idosos no país e nós estamos numa geração que estamos envelhecendo com saúde. Eu não quero fazer propaganda de Corega. Somos o sexto país mais velho do mundo. Como vai ser daqui para frente?”, questionou.
Vivian acrescentou que essa revolução já está começando. “Quando a gente fala de transformar a moda isso significa transformar a relação das pessoas com a moda, falando de processo produtivo, de sustentabilidade. Acho que todo esse caminho passa pela liberdade de ser quem se é, muito voltada para autoestima, autoconhecimento, autoconfiança e para a moda responsável", pontuou. "A gente acabou de fazer uma campanha da moda responsável, lançada em 8 de outubro, porque oito em cada 10 de nossos produtos tem produção responsável. E em 2023, que foi um ano muito emblemático pra nós, começamos a olhar para mulher mais madura de uma forma mais contundente”, emendou Vivian.
Para reverter a invisibilidade
Como a publicidade ajuda a invisibilizar as pessoas a partir de 50 anos, Lara indagou se no estudo "Revolução da Longevidade" foram apontados caminhos para reverter isso. Rita explicou que, na pesquisa, foram mapeadas as dores do etarismo, como vulnerabilidade, estereótipo, não se enxergar no mercado, falta de casting da faixa etária, e as forças das pessoas mais velhas, como o autoconhecimento, liberdade e a força se reinventar.
Dentro desse escopo do autoconhecimento citado por Rita, Claudia acrescentou que costuma dizer que é um "corpo político". “Eu sei onde eu quero chegar e com quem eu quero estourar o champanhe. Então, é importante você se colocar na prateleira que você acha que deve estar”, afirmou.
E com o número de pessoas mais velhas em todo o mundo aumentando expressivamente, o cuidado para conhecer melhor quem elas são, de fato, e desconstruir visões ultrapassadas, deve ser uma constante para a indústria publicitária. “Até o fim do século vai ter uma população de 75 anos+ que nunca houve no planeta, e isso é inovador. Olha a quantidade de pessoas mais velhas que estão em volta de vocês, que estão se reinventando e não tem como ficar colocando os mais velhos na situação de 'encostados'. Noventa por cento dos briefings que vocês recebem são para rejuvenescer as marcas, e por que não trazer para essa galera o conceito de longevidade? Isso vai ser o super macro trend no nosso século”, avaliou Rita.
Para finalizar, Lara trouxe mais um dado contundente. Apenas 5% dos colaboradores das agências são pessoas acima dos 45 anos. Fernanda afirmou que tem medo de daqui a dez anos, quando estiver com 47 anos, não ter mais espaço para ela mercado de trabalho, e admitiu que tem adiado o desejo de ser mãe por isso.
Ou seja, o caminho é longo, e com certeza não há solução fácil para combater o etarismo.
Silvia Herrera