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Festival do Clube 2024

O que fazer para termos mais mulheres no áudio

22.10.24

O 12º Festival do Clube de Criação organizou um painel só com mulheres que trabalham no mercado de produção de áudio para um debate sobre os desafios das profissionais no setor. Esse é um segmento da indústria de comunicação em que os homens estão em maioria. O cenário está mudando, porém é necessário que mais transformações aconteçam para haver mais equilíbrio.

A mesa “Mulherada do som: espaço, reconhecimento, valorização” trouxe contribuições como as da maestrina Janecy Nascimento, sócia-fundadora da Loud+, que tem 25 anos de experiência no setor: “Ainda há poucas de nós no áudio. A tecnologia foi criada por homens e é oferecida aos homens desde a infância. Nós, mulheres, já conquistamos muito, mas há ainda muito a se conquistar”, afirmou.

O painel foi composto por Lili Domingues Aragoni, produtora executiva da Punch Audio; Lu Novelli, sócia-fundadora e produtora executiva da Pingado; Luna França, cantora e produtora da Evil Twin; e Tatiana Nascimento, sócia-fundadora da Janga, além de Janecy. Bia Ambrogi, presidente da Apro+som, foi a mediadora. Elas ressaltaram que o mercado de áudio é dominado por homens brancos e héteros. E pontuaram que as mulheres precisam pensar no coletivo para que seja conquistada a equidade de gênero no segmento.

Bia destacou que ainda existe no setor uma área que é 100% masculina, a dos mixadores de cinema. Ela e as demais integrantes do painel compartilharam suas histórias e procuraram mostrar a evolução do mercado.

Janecy, que começou na profissão como violoncelista, observou primeiro que, no passado, as produtoras tinham de contratar maestros, músicos, um estúdio. Hoje, quem faz tudo isso é o produtor musical. Fazendo um paralelo com a atividade de uma ceramista, ela disse que antes se criava no barro e atualmente o artista trabalha com Lego. Ela comentou que, com a tecnologia, o acesso foi democratizado, sendo possível compor em casa, com o computador ou até mesmo via celular.

Mesmo com esses avanços, o setor ainda demanda mais transformações. Segundo Janecy, não há uma mobilização para a maior inclusão da mulher. A maestrina pontuou que isso é algo global. Por aqui, é necessário um movimento que traga mais representatividade para o mercado. “Ainda hoje ouço dos clientes: ‘fala com o seu maestro para baixar um tom’”, contou.

Sororidade, empatia, oportunidades e rupturas

Há quase três décadas no segmento, Lu Novelli argumentou que, para haver mudanças impactantes, é importante ter mais mulheres em cargos de chefia. Assim, elas podem abrir as portas para outras. “É preciso sororidade e empatia”, avaliou.

Tatiana Nascimento afirmou que dá oportunidades para pretas e pretos na Janga, mesmo que estes não tenham a formação adequada. Com isso, ela vem aprendendo muito no dia a dia. “A mulher preta é a base da sociedade brasileira e para trazê-la não é possível oferecer as jornadas de mais de oito horas do setor. Não é possível concordar com as regras escravocratas da publicidade brasileira”, criticou. “Para que ter três turnos de oito horas numa produtora de som?”, disparou.

Como vou tirar essa mulher do que faz – e que dá a condição para as outras mulheres trabalharem – para ela ser uma produtora? Então, preciso criar outro mundo dentro da minha empresa para poder trazer essa mulher negra, para ela não trabalhar 24/7. E isso também é muito desafiador”, disse Tatiana, que atua no áudio há 20 anos. “Tê-las ao meu lado ajuda para que esse processo seja quebrado”, esclareceu.

Lili Aragoni, por sua vez, manifestou preocupação com os jovens que estão entrando no mercado. Ela ponderou que, com a adesão da indústria ao home office, os estágios nas produtoras acabaram. Contato com outras gerações foi fundamental para sua formação, salientou Lili. “Quando comecei, a gente aprendia na prática. Ia ver como cada setor funcionava. Hoje, com o home office, que chance os estudantes têm de entrar nesse mercado?”, indagou.

Tatiana trouxe outro desafio enfrentado pelas mulheres: os cargos oferecidos são em áreas “que exigem cuidado”. Ou seja, são na produção executiva, e não na criação. “Mas cuidado exige muita criatividade também. Você tem de ter três mil braços para dar conta de tudo. Tem de ser muito criativa para fazer tudo o que fazemos”, emendou.

Luna reforçou o argumento de Tatiana. “Sempre que há o lado subjetivo ou que se alimenta dessa subjetividade, seja criando uma música ou criando soluções, a mulher usa a criatividade”, ressaltou.

Em sua carreira, Luna se equilibra entre ser cantora e produtora musical, o que não é uma tarefa fácil. “Meu trabalho na publicidade é compor trilhas sonoras para um cliente ou para uma marca. Ser cantora e compositora é como eu me expresso para o mundo. O palco é o local onde me sinto mais realizada”, comparou. Na publicidade, os prazos são curtos. Já para suas músicas, não. No entanto, nas duas atividades ela usa sua criatividade.

Camadas

Lu Novelli frisou que o tema da equidade de gênero na produção de áudio tem muitas camadas.Era pior em 1998. A gente não se via produzindo, não se via dona de produtora, a gente não se via presidente de conselho”, declarou. Hoje, sim. “A ideia é que as próximas gerações de mulheres cheguem aonde nós chegamos e consigam alcançar um pouquinho mais, inclusive as mulheres trans, que hoje no mercado publicitário são menos de 1%”, afirmou.

Outro desafio feminino elencado foi a maternidade. Atualmente, as agências abrem mais espaço para as colaboradoras irem buscar os filhos na escola, mas ainda há colegas que olham torto para isso. Lili teve de fazer uma pausa para ter seus filhos. Hoje, isso não seria preciso. “Não tenho medo do futuro, mas eu espero estar nele. Então, preciso entender o que vai estar nele”, provocou.

Janecy, mãe de quatro filhos, trouxe mais uma camada: a educação. “O piano tem de estar aberto para todas as crianças, os meninos e as meninas. Qualquer área é para os dois”, pontuou. E Lu acrescentou a questão da formação da profissional. “Hoje é possível aprender muito na internet. Há de tudo na rede, e gratuito”, observou. Bia salientou que o painel trouxe muito da jornada de cada uma daquelas mulheres, como realizadoras, produtoras e profissionais. E mostra que elas estão deixando um importante legado para as futuras gerações de mulheres do áudio.

Silvia Herrera

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Festival do Clube 2024

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