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Mais um ‘ano do mobile’

Novas perguntas para um mercado em expansão

26.10.17

Há uma brincadeira corrente entre os especialistas do mercado digital. É dizer que “este é o ano do mobile”. Virou piada porque já há algum tempo que essa frase vem sendo repetida como se o segmento tivesse de comprovar que “agora vai”. No evento IAB Mobilidade, realizado pelo IAB Brasil na terça-feira 24, diversos números foram apresentados, comprovando a força do setor e sinalizando que a indústria da comunicação ainda terá muitas perguntas a se fazer. Afinal, novos desafios irão surgir enquanto tecnologias como realidade virtual, comandos de voz e inteligência artificial estão se consolidando.

De todo modo, está claro que o mobile vem transformando negócios e continuará a transformar por mais tempo. Rafael Magdalena, COO e cofundador da MUV, trouxe dados atuais e projeções a respeito da penetração do celular. No ano passado, o mobile somava 4,8 bilhões de assinantes únicos no mundo. A estimativa para 2020 é esse número passar para 5,7 bilhões. Na América Latina, uma revelação: 39% das conexões eram 2G em 2016. É um percentual que chega a surpreender e mostra como o consumidor enfrenta obstáculos para consumir certos conteúdos, entre eles o vídeo, ou até ter experiências mais impactantes como a realidade aumentada. O cálculo é que esse índice baixe para 22% em 2020.

Um comportamento que chama atenção hoje é o volume de downloads de aplicativos. Há uma crença que os apps “morreram”, como já morreram várias coisas na web (inclusive a própria internet). Como Rafael salientou, o ritmo diminuiu, mas se mantém positivo. Houve uma variação de 15% entre 2015 e 2016. Por outro lado, a receita na loja (iOS e Android) aumentou bastante no mesmo período: 40%.

App, então, vale a pena?

É importante observar que, em outro painel, Ricardo Feldman, diretor de vendas da Adjust na América Latina, apresentou dados que revelam outro lado dos aplicativos. E isso deveria levantar algumas perguntas no mercado. Primeiro: 90% do tempo dedicado ao mobile são gastos com apps. Porém 95% das aplicações são abandonadas depois dos primeiros meses da instalação. Mais do que isso: 58% dos usuários irão deixar de utilizar um aplicativo nos primeiros 30 dias de uso. E 62% não chegam a completar um ano usando um app.

Para onde vamos?

Algumas instituições de pesquisa e análise do mercado de comunicação já traçaram previsões sobre o futuro do mobile. Um report da Gartner, por exemplo, sugere que em 2020 a indústria dos apps estará definhando. No entanto, como Rafael Magdalena, da MUV, declarou, é difícil prever o que vai acontecer com o mercado daqui a um ano.

Mas algumas tendências merecem crédito. Inteligência artificial e machine learning são temas que estão em quase todas as discussões dos fóruns de publicidade e marketing hoje. Quem pensa que as tecnologias serão rapidamente incorporadas pode levar em conta o famoso meme em que colocava em xeque a inteligência por trás das máquinas: as diferenças entre muffins e chihuahuas. Como a máquina poderia identificar quando era um e outro em imagens tão reduzidas? Mas os índices de erros na identificação de imagens e de voz estão caindo.

Chatbots entram na mira porque o recurso até já vem sendo utilizado, mas quantos desses serviços estão realmente dotados de inteligência artificial? É uma questão crítica. Segundo Rafael, 80% das pessoas que usam os chatbots reclamam da acuracidade. O que o levou a dizer que hoje boa parte desses serviços está mais para árvore de navegação do que para IA. “É a personalização do ‘deixa ver se encontro seu cadastro’”, afirmou.

Qualidade da conexão também é um ponto que merece atenção, sobretudo levando-se em consideração a quantidade de celulares que ainda navega com 2G na América Latina. Mais de 100 milhões de pessoas recorrem ao Facebook Lite, comentou Rafael. Por isso, um caminho que marcas têm percorrido é o patrocínio de dados. Empresas como Santander, Natura e Mercado Livre estão bancando esse consumo nos aplicativos, pagando diretamente às operadoras.

O poder do vídeo não é novidade. Ele se expande em ritmo intenso. Um relatório da Cisco indica que 82% do tráfego da internet em 2020 estarão destinados ao vídeo. As redes sociais, claro, estão atentas a isso. O Instagram cresce com seus vídeos. E no último F8, encontro de desenvolvedores do Facebook, já se falou de monetização do live.

Entre as tendências, Rafael apontou ainda a frictionless computing, que se refere a tecnologias que facilitam processos que poderiam ser demorados. Um exemplo são os serviços com reconhecimento de voz. Anunciado neste mês, o fone de ouvido do Google, o Pixel Bud, permitirá ao usuário ter conversas com um estrangeiro, fazendo tradução em real time. O celular – no caso, o Pixel, device do próprio Google – grava o interlocutor. A versão na língua do usuário chega pelo fone. Outras tecnologias com comando de voz, como a Alexa, a assistente digital da Amazon, sinalizam um novo mundo para o mobile.

Por que você está indo embora?

Falando do presente, muito se debate a respeito do uso de dados. Entretanto, quantas empresas estão sabendo, de fato, trabalhar com informações? O questionamento veio de Fábio Rowinski, diretor de inteligência de mercado e operações da Globo.com, no painel “Como o mobile gera mais engajamento e consumidores leais”. Algo que não tem despertado muito interesse, embora devesse, se trata das razões do insucesso, como pontuou Gustavo Macedo, diretor de content & creative na iProspect. Já que o índice de abandono de apps é tão grande, por que não buscar o motivo desse comportamento?

Para exemplificar seu ponto, Macedo narrou uma experiência que teve com um taxista. Ele notou que o motorista tinha meios de utilizar o Waze, mas preferiu tentar encontrar caminhos sem a ajuda da tecnologia. Preocupado com o trajeto, o executivo da iProspect acionou o app e uma voz masculina orientou, em voz alta, a direção a ser tomada. O motorista se surpreendeu. Ele não sabia que era possível colocar voz masculina no aplicativo. E, em seu machismo, se justificou. Acreditava que a voz feminina do Waze mais atrapalhava do que ajudava. Como saber da real causa da resistência desse usuário em adotar o app?

Métricas de insucesso não estão claras para a gente. Quantos dados perdemos por não investigarmos isso mais a fundo? Quais são os pontos do desengajamento?”, alertou Macedo. Rafael Carvalho, head of advertising da OLX, afirmou que, no caso deles, a empresa tem de fazer trabalho de campo por região para entender os comportamentos do usuário. Cada área tem padrões diferentes e isso precisa ser compreendido pela OLX – desse modo, diminui-se a chance de insucesso. E, com isso, reforçou o questionamento sobre a maneira inteligente de se utilizar as informações colhidas pelas companhias: “A primeira coisa é olhar para a empresa e estudar como ela tem trabalhado com dados”.

 

Lena Castellón

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