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O mundo tá chato? (Rodolfo Monteiro)
“O mundo tá chato” é o novo “No meu tempo era melhor”?
Quando eu tinha uns 13 anos, poupei minha humilde mesada e comprei um CD de uma banda nova. A guitarra barulhenta, a bateria matadora e o vocal que misturava metal com rap tiveram um efeito tão grande em mim que me senti obrigado a ouvir no último volume no stereo da família.
Meu pai entrou na sala, me viu pulando no sofá e perguntou:
- Que barulheira é essa?
- Rage Against The Machine - respondi.
- No meu tempo, banda boa não tinha que tocar alto para aparecer - argumentou.
- Pô, pai. Deixa de ser velho – pensei.
Alguns (muitos, admito) anos depois, me pergunto se não estou seguindo meu velho em direção à senioridade. Não tanto pela calvície (que parece ter pulado uma geração), mas por pensar que tudo, no meu tempo, era melhor. As bandas eram mais cabeludas, os filmes eram mais violentos, a comida tinha mais glúten. Até a publicidade era mais criativa.
Quando vejo o CONAR podando uma campanha, ou um comediante tendo que se retratar publicamente, minha percepção é de que o mundo está cada vez mais chato. Mas será que está mesmo, ou eu que pertenço a uma outra geração?
Me questiono isso porque realmente vejo a sociedade optando por um caminho mais politicamente correto (careta, diriam uns mais velhos do que eu). Mas seria isso ruim? Será que não passou da hora de pararmos com piadas de gênero, étnicas e de classe?
Talvez eu ache que o mundo está chato porque fui criança nos anos 80 (ah, que saudade da Era Reagan) e adolescente nos 90 (descanse em paz, Kurt). Minhas referências são diferentes de alguém da Geração Z (que dirá da alpha). Estes consumidores já nasceram neste “mundo chato” e, para eles, sempre foi assim. Logo, não podem dizer que no tempo deles era melhor.
Este é o tempo deles.
E se eles são o target do nosso cliente, então temos que respeitar o zeitgeist, aceitar que este é o espírito deste tempo e nos adaptarmos. Nosso trabalho ficou ainda mais difícil, mas também mais desafiador. E isso é bom. Pois se as redes sociais deram voz a grupos que antes não tinham como falar “ei, você me ofendeu”, também permitem que digam “ei, você me representa”. E não é este o post dos sonhos de qualquer marca?
Confesso que esta linha de raciocínio foi uma aplicação de botox na minha opinião. Afinal, para quem nasceu antes dos movimentos sociais dos anos 60, pode ser estranho ver um negro mandando na Casa Branca. E mais estranho ainda se uma mulher o suceder. Ou um socialista.
Daqui para frente, vou tentar não pensar que no meu tempo as coisas eram melhores e que o mundo está cada vez mais chato. Isso pode acusar a minha idade.
E envelhecer pode ser uma coisa linda. Menos para quem é publicitário.
Rodolfo Monteiro, redator da Salles Chemistri