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O Espaço é Seu

Há 24 anos eu não somente existo, mas resisto

27.11.17

Eu nunca fui de me expor sobre o que penso ou sinto, e principalmente sobre a minha deficiência. Mas hoje decidi dizer que há 24 anos eu não somente existo, mas resisto.

Comecei a resistir ao querer, ainda na pré-escola, abandonar os estudos porque as outras crianças não falavam comigo e me excluíam das brincadeiras. Resisti ao subir em um palco, encarando uma plateia super lotada, para encenar duas personagens, e, após um tempo, ouvir uma pessoa que assistiu perguntar se eu havia sofrido um acidente. Ouvir elogios? Nem pensar!

Eu resisti ao encontrar no meu caminho pessoas que tinham vergonha de mim e também as que achavam que eu não devia ter orgulho próprio. Ah, cito também aqueles que me tratavam mal e hoje tentam retomar amizades 'inexistentes'.

Eu resisto ao perceber que quanto mais evoluo, pessoas que me conhecem há tempos mudam a forma como me tratam. Continuo resistindo todos os dias quando pessoas me encaram nas ruas, de diversas maneiras, algumas com expressão assustada.

Resisto quando ouço pessoas dizendo que eu ‘transpareço’ que a minha deficiência é normal, pois, se eu não exponho os meus sentimentos, isso deve ser sinal de que não sofro com minhas dificuldades. Errado: é hora de parar com este mito de que os deficientes só vivem de forma otimista.

Eu resisti quando decidi aprimorar meus estudos em áreas como operação de câmera e fotografia, e tive de lutar de diversas maneiras para comprovar que conseguiria fazer e não tiraria a vaga de uma “pessoa normal".

Resisti ao precisar sempre me destacar para poder ter algum peso equivalente ao das "pessoas normais", e levar muitas marteladas por isso.

Resisti também ao receber olhares de dúvida em relação às minhas habilidades em cada trabalho que chegava.

Resisti à assistentes de direção tirando a câmera da minha mão à força e a pessoas tentando me impedir de realizar meu trabalho dizendo: "melhor não".

Eu resisti a tudo isso e mantive minhas experiências de preconceito escondidas. Fique calada por anos, esperando que o meu trabalho falasse por mim. Todos os dias, quando arrumo meus cabelos coloridos, me visto, me maquio e saio de casa, nunca sei quem exatamente vou encontrar, como vão me olhar e como vão me tratar. A única coisa que sei é que será mais um dia onde terei de resistir”.

Gabe Maruyama, da dupla de diretores de cena Angry, da Academia de Filmes

O Espaço é Seu

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