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Pelados (Henrique Castilho)
Resumindo, a história é esta: um malandro chega a um reino, finge-se de alfaiate e promete ao rei tecer-lhe uma roupa que só os inteligentes podem ver. O rei, com medo de se passar por ignorante, veste a roupa invisível e sai por aí desfilando seus pentelhos reais. Ninguém da nobreza tem coragem para admitir que pode ver a majestosa piroca do monarca e que, portanto, não faz parte do grupo dos inteligentes. Até que a voz de uma criança, inocente, ressoa do meio da multidão: "O rei está nu!".
Mas este texto não é sobre isso. Quer dizer, é. Mas não é.
Criação é a área mais subjetiva da agência. Não tem Excel, quatro pês ou prova dos nove. Por isso fica tão difícil avaliar uma ideia e também por isso as opiniões raramente são unânimes. Não é porque a campanha bombou que a ideia é boa. Não é porque não vingou que a ideia é ruim. Não é porque ganhou prêmio que é boa. Não é porque não inscreveram que é ruim. Os critérios boiam em um mar de abstrações, onde os inseguros se afogam a cada job enquanto pensam "não é que eu sou uma fraude mêmo?".
E isso abre uma brecha de onde surge uma porrada de roupas invisíveis do rei. São elas:
Cannes ou prêmios em geral; superproduções; ficha técnica com gente importante; agência que criou; layout moderno; marca legal assinando; veiculação em sites de propaganda; design hypado; e mais infinitas variáveis que cobrem a ideia crua, anotada durante o brainstorm, filha da dupla que pode ter passado por um parto doloroso ou ter sido obrigada pelo prazo curto a improvisar uma ideia prematura que, nem por isso, é ruim. Assim como ser mirabolante não torna uma ideia boa, muito longe disso - pode, inclusive, ser recurso para dissimular um insight terrível, coberto por uma dúzia de slides que fazem de tudo para fugir do principal, daquela ideia contada em uma linha. É esta que importa.
Esta ideia, anotada durante um brainstorm, fruto da cachola de algum criativo, descrita pelo redator em um arquivo de Word como este aqui, materializada em imagens pelo diretor de arte em um Photoshop, ou mesmo direto no keynote. Esta ideia, que ainda não sofreu interferências de estúdios, diretores, que ainda não está assinada por um logo que pode deixá-la mais cool ou mais cafona, virgem da opinião de pessoas influentes e dos prêmios. Esta ideia que já era boa antes de ser produzida com a última tecnologia, antes de virar uma produção cinematográfica milionária, antes de ser um 3D com um render perfeito. Ou o contrário: que ainda é boa apesar da produção low cost, da agência desconhecida, da opinião contrária de alguém que você respeita, mas que, desta vez, discorda. Esta ideia, sim, é a ideia que deve ser julgada.
Porque a existência de um prêmio pressupõe a existência de um critério. E falta um debate que tenta definir esse critério. Um critério que, de preferência, seja justo com os criativos. Principalmente quando estivermos falando sobre "prêmios de criatividade", que hoje acabam condecorando mais produção, tecnologia e release do que… criatividade. A ideia é boa ou só saiu nos sites de propaganda? É ruim ou só foi feita com pouca grana?
Despir as roupas do rei é colocar as ideias no mesmo ringue, de igual pra igual, olho por olho, dente por dente. A partir daí, então, um título poderá disputar com uma ativação megalomaníaca, porque os dois são uma ideia, independentemente do formato. E a pasta de um criativo que trabalhou numa agência pequena e que, por isso, não teve a chance de colocar uma grande ideia na rua, não vai perder para a de alguém que começou num lugar grande.
Saber definir o que é uma ideia e quais os melhores critérios de avaliação ajuda, além de tudo, a derrubar arbitrariedades de um mercado competitivo, a dar mérito a quem merece, a colocar o talento acima da oportunidade, do jogo de cintura, do papo furado que coloca prêmios nas mesas erradas, pessoas nas cadeiras erradas, bônus nas contas erradas.
E qual seria esse critério infalível? A regra soberana? O primeiro mandamento? A peneira absoluta pela qual só passam as ideias realmente boas?
Não sei. Não tem. Mas tentar encontrar pode ser um começo.
Por essas e outras que criei o "Ideia em cima da ideia", um perfil no Instagram com o objetivo de reunir pessoas interessadas em debater propaganda. Mais especificamente, criação. Mais especificamente ainda, ideias.
Onde? instagram.com/ideiaemcimadaideia
Traje? Nenhum.
Henrique Castilho, redator e autor do projeto Ideia em cima da ideia