O espaço é seu

A Paris Hilton vestiu um micro-vestido, pegou uma cerveja na geladeira e ganhou mais de um milhão. A Tessália fez (supostamente) um polêmico blowjob em rede nacional e vai faturar uma bolada – sem duplo sentido – da Playboy. Até quem doa sangue ganha pelo menos um lanchinho no final. Só o maltrapilho do estagiário é que continua de mãos abanando. Tudo bem que muitos não fazem nada, mas sejamos francos, se contratou tem que pagar.

O mercado vive comentando sobre o desempenho das agências brasileiras nos prêmios internacionais. Mas, por que não olhamos para nosso próprio umbigo? Longe dos holofotes, outra questão há muito tempo está presente na rotina dos criativos. Cá entre nós, quem foi que inventou que estagiário de propaganda é um cara obrigatoriamente não-remunerado?

É por essas e outras que nosso país é um dos líderes em desigualdade social. Enquanto muitos diretores de criação vão para as agências dirigindo carros importados, pensando nos próximos leões, os estagiários estão aí, sonhando apenas com um vale-transporte. E são os pais que pagam o pato, e também a passagem, o almoço e até o cursinho de portfolio.

Tenho uma sugestão. Não é original mas vai ajudar. Nossa própria seleção de rugby já fez isso antes. Vamos juntar vários estagiários, de diferentes áreas, criação, mídia, produção e atendimento (esta principalmente). Com todos reunidos, faremos um calendário no melhor estilo “nu-artístico”, recheado de peitos, bundas e outras coisas bem menos suntuosas. Assim, levantaríamos algum dinheiro e, de quebra, a galera da agência ganharia 12 páginas bastante sugestivas para folhear.

No final do ano faríamos uma promoção para queimar o estoque. Comprou um anuário levou um calendário. Na época, um redator famoso fica encarregado de fazer um título sem essa rima pavorosa.

No ano seguinte a mesma coisa. Centenas de recém-formados prontos para tirar a beca (só tomem cuidado quando forem jogar os canudos) e posar para as novas fotos que vão dividir as prateleiras com os anuários. Os estagiários finalmente vão poder mostrar em casa o que fizeram na agência. Mesmo que isso não seja nenhum motivo de orgulho.

Será que esse tal mercado da propaganda não tem condições de garantir o mínimo possível para seus estagiários? Será que as agências vão continuar adotando esta prática tão mesquinha e exploradora? Será que a única maneira de um profissional mostrar seu talento é ficando de barriga e bolsos vazios? Chega de serás. Já passou da hora de mudar de atitude. Para terminar, quero deixar claro que minha intenção não é fazer nenhuma apologia à pornografia, mas é que trabalhar de graça por si só já é uma puta sacanagem.

 Marcelo Fernandes - redator carioca

Comentários

Thiago - Sem contar que não pagar estagiário tira do páreo uma série de bons talentos que simplesmente não têm condição econômica para bancar meses de trabalho...

Adriano Silva -  Bom, os estagiários de publicidade estão nessa situação porque o Brasil é, e faz tempo, um país de m..rda.

yuri -  No meu ver o problema vai muito além dos estagiários... "Agência contrata Diretor de Arte online requisitos: Photoshop, Illustrator, Flash, Dreamweaver, AS2, AS3, PHP, Javascript, Ruby, XHTML, CSS. R$ 1.200,00..." a vaga postada acima não existe mais já vi muita coisa parecida por ai. Agora me falem como é que um pai de familia vai colocar seus filhos na escola com um salário que deveriam estar pagando para estágiarios.

mica - - Apesar de polêmico, o assunto merece mesmo uma reflexão. E que bom que veio de um cara que não é estagiário. Boa inciativa, Marcelo.

Anna Paula Castanha -  Eu apoio a iniciativa. Deixei de ser estagiária há pouquíssimo tempo para ser assistente de arte, mas o salário é ainda tão mínimo que tenho mais vergonha de revelá-lo em público do que minha própria nudez. Na faculdade aprendemos fazer campanhas grandiosas, mas no mercado temos que vender a auto-estima desde o começo para ser alguém na vida. A minha já está em promoção.

eliara - o estagiario tem q se interessar e aproveitar a oportunidade pra sugar o maximo...assim sendo ou nao reconhecido ira aprender e pode ser melhor que muita gente contratada...

Arnaldo -  Ah meu amigo, te cubro de razão. E te digo mais: não são só os estagiários que ainda estão na faculdade que se ferram. Tem gente formada há mais de 5 anos pagando pra trabalhar. Achei seu texto muito feliz e lotado de urgência, mas... se as pessoas realmente se dessem ao trabalho de se preocupar com isso, teriam pelo menos mais uns 10 comentários como o meu aqui. Quer um conselho? Chega na hora (as pessoas ainda ligam pra isso, mesmo que você tenha saído às 3 da manhã do dia anterior), nunca diga não pra nenhum jog que te passarem e faça o seu trabalho da melhor maneira possível. Sorte ai!

Thiago Moreno -  Essa questão é complicada mesmo. São muitos graduandos pra poucas vagas. É a lei do mercado, não tem jeito , o preço cai. Ao ponto de muita gente se sujeitar a trabalhar de graça. Lembrei logo do que diz o Julio Ribeiro no "Fazer acontecer": Não se faz uma bolsa de seda com orelha de burro. Como ele conta no livro, você pode fazer um time de basquete só com anões. Economiza nos uniformes, calçados e por aí vai. " Economiza, mas não vai ganhar jogo nenhum." Nós,estudantes, o que temos que fazer é nos "descomoditizar", deixar de ser mais um, é tentar a cada dia dar um passo a frente pra sair do bolo. E acho que se o CCSP voltasse a organizar concursos oferecendo vagas nas agências seria uma grande ajuda. Cabe aos estudantes entrar de sócio do Clube e pentelhar pra que iniciativas como o " Estagiário do ano" voltem a acontecer. Sobre o calendário, Marcelão, sei não. Melhor deixar com só as mais talentosas do atendimento.

Anderson Ribeiro - Isso sem contar o quanto sofre um assistente de arte em agências de grande e médio porte , é uma exploração, trabalham e ganham míseros salários.. e todos ainda acham que isso faz parte do processo.. é uma vergonha mesmo.. por isso que cada vez mais os grandes talentos vão abandonando a propaganda..

kika - Concordo, pagar o próprio trabalho já virou sinônimo de estagiar em pp. Basta! Quando tiraremos as roupas?

Tico_Campos - Ótimo post. Mas este calendário só vai servir pra contratar estagiária para o atendimento. hhehehee

Felipe - Concordo com o Thiago, muita gente deve ter ficado fora de boas agências porque não tinha condições de se sustentar. Num mercado que rola tanta grana e tanto ego, poderia sobrar pelo menos um salário mínimo e um pouco de respeito. E falando um pouco além, assistentes de arte também são tratados com desdém em muitas agências e na realidade são eles que fazem todo dia o milagre de deixar tudo perfeito "pra ontem".

pedro drable -  Concordo, marcelo. Pena que a galera do nosso nível não toma decisões desse porte. Ainda assim, muito bem exposta a opinião. Só não me vem com essa de tirar a roupa, haha

C -  Eu dúvido que um diretor de criação vá perder tempo lendo esse texto quando identificar o tema. Ou, se ler, nada vai fazer. Porque a cabeça dele vai coçar por 1 hora, no máximo, mas amanhã, já esquece que alguém ali passa meses sem receber e volta na sua interminável busca por leões. Que diferença faria 500 reais para uma agência? E não me venha com bla-bla-bla.

ricardo -  Os donos do negocio querem ser os novos Abilio Dinis, mas não pagam nem metade da conta, seja em hora extra, seja pra estagiarios bons e baratos, e só querem leões...

Gustavo - - Sei como é f*da, mas o problema é o ciclo vicioso. A galera se sujeita a ganhar nada, logo ninguém vai pagar mais pelo que tem de graça. Aí, naturalmente só quem consegue entrar no mercado é quem é filhinho de papai, porque pagar pra trabalhar, ainda mais no Brasil, não é pra qualquer um. Já passei por isso, mas também não adianta só fazer piada com os amigos...a solução é ir pulando de galho em galho, começa num lugar menor (onde a oferta de pessoas de graça não existe) e conforme você vai melhorando, vai pra lugares melhores ser remunerado. Afinal, quem trabalha de graça só trabalha sem ganhar nada até aprender uma grande lição: Nunca trabalhe de graça.

Daniel Simões -  O grande problema das agências de publicidade brasileira se chama EGO, Eles não estão nem ai para o pessoal que ajuda a trabalhar no dia a dia eles querem mesmo serem reconhecidos em palestras, jantares de CABORÉ e outros festivais e etc. Só que tem o lado do estagiário que aceita isso , muitos aceitam tudo de bico calado, pensam que o pessoal vai perceber o duro que eles estão dando no trabalho e no final irão ser contratados.  

Léo - Ótimo texto Marcelo... O grande problema é o que vários colegas já comentaram: "Tem gente que se sujeita a trabalhar de graça". Acabo de me formar em PP e comecei a trabalhar com um free, cubrindo as férias de outro redator em uma agência menor. Obviamente, valorizei os 4 anos de mensalidades investidas pelo meu pai e não topei trabalhar de graça. Posso não ganhar muito bem, mas não deixo que subestimem e desvalorizem o que tenho para oferecer. O que precisa ser feito é os próprios estagiários tomarem vergonha na cara e não se rebaixarem a trabalhar de graça. Procurem trabalho em agências menores, se ninguém aceitar trabalhar de graça vai faltar mão de obra pros grandes, já que muitos que ganham bem PRECISAM de estagiários, senão não conseguem ter uma ideia que vai lhe dar algum leão. TEMOS QUE NOS VALORIZAR.

Alysson Estopa -  Realmente pagar pra trabalhe né, é uma p..ta sacanagem, sem contar com os abusos não é mesmo.

 Tiago R. Borges - Estudantes que tem a bunda na sombra da boa vida não dão a minima para o fato de terem que trabalhar alguns meses de graça... afinal de contas o que são mais alguns poucos meses as custas dos pais? enquanto isso os bons de verdade, que se empenham e estao borbulhando de coisas boas para mostrar se prostram no canto da obscuridade por não possuir meios e modos de se manter em um estagio onde se paga para trabalhar. Os estagiarios tem que se proteger dessa rede... Valeu pelo texto Marcelo...