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O Espaço é Seu

Parem de falar 'conteúdo' (Carla Said)

13.11.24

Parem de falar "conteúdo" (ou: A nova publicidade tradicional)

Há mais de dez anos, eu acompanho (e participo ativamente) da evolução da área de “conteúdo” das agências. E, desde lá no começo, quando tínhamos que criar dezenas de posts por dia, eu já entendi que o negócio pedia muita, mas muita capacidade criativa, e também atenção aos movimentos culturais.

Por outro lado, o que também deu pra perceber logo de início é que a “criação criaçãomesmo, não entendia bem isso. E, o mais chato, não valorizava.

Só que passou o tempo e essa percepção seguiu viva - e até mais ampla por parte de outras áreas e agências como um todo: a diminuição dos criativos, por assim dizer, mais interessados por redes. Um incômodo que eu sinto em muitos colegas, mas não vejo tantas pessoas falando abertamente sobre.

Eis que, ontem, assisti uma entrevista com o Marcello Serpa - minha referência grandona no mercado - e percebi que ele também nutre um certo incômodo pela expressão “conteúdo. No caso, disse que “acha a palavra boba” - e eu entendi exatamente o que eu sempre senti esse tempo todo.

Conteúdo me parece uma palavra criada (e, principalmente, mantida) para que os publicitários tradicionais - não só criativos, importante reforçar - não tenham que lidar com uma criação que consideram “menos importante, podendo se apoiar em frases como “não consigo acompanhar”, “não entendo o que é always on” ou “(adicione aqui qualquer coisa que você já ouviu)”.

Afinal, é bobinho querer conversar toda hora, né?

Puxando o gancho e falando especificamente em "ALWAYS ON" (ou mais intimamente: AON), ele é algo que a mídia também usa. A “Performance AON” é simplesmente uma mensagem paga para estar ali, sempre viva e operante. Por meio de emails, notificações push, banners e tantas outras peças clássicas que o mercado pede tooodos os dias aos seus criativos.

Sim! Esse seria um AON ~tradicional rs

Mas, voltando à entrevista, a real é que, quanto mais lembramos dos publicitários “referência (Serpa reforçou no papo e Olivetto dava um banho nisso), mais a gente relembra que criação é sobre cultura. Sobre entender o que está acontecendo e acompanhar os movimentos. Sobre se interessar pela sociedade. Sobre ser relevante para a sua época.

E não é isso que são as redes sociais?

Um lugar de grande troca de comunicação, presença de pessoas e criação de cultura? Ou ainda é novidade pra alguém que as redes trouxeram uma nova forma de consumo e criaram uma linguagem que é basicamente impossível de ignorar hoje em dia? Que setam muitas das campanhas que saem, com ideias surgindo a todo momento de memes e trends?

E, vamos combinar, esse tipo de criação é só mais um estilo, um espaço, um FORMATO de comunicação que, sim, tem suas particularidades, mas não é nenhum bicho papão (e, não, você não precisa gostar, tá?). Ou você já pensou em aproveitar seu SPOT e colocar na íntegra em um OUTDOOR por “não curtir tanto a linguagem”?

Ah, para ow.

Não tem porquê alguém fazer isso, uma vez que a função da publi é respeitar o espaço que você vai anunciar e tentar fazer dele o mais agradável possível. O que, aliás, foi outra coisa que o Serpa comentou: “Você só interrompe quando você é chato. E publicidade não precisa ser isso. Publicidade pode entreter”. Parecido com o discurso do “conteúdo”, não?

Ai, como eu adoro esse homi, minha gente #Serpete

Eu sei, eu sei. É CLARO que, desde que surgiu, essa dinâmica das redes (quantidade de players, público, tom, necessidade de investimento) já sofreu muitas adaptações. É fato que o negócio evoluiu rápido e é normal a gente se perder em termos como influs, creators, publis e algoritmos variantes.

Só que também não temos como ignorar que, hoje, está tudo mais profissional e tem muita marca investindo grande parte do seu orçamento ali - e só isso já é um excelente motivo pra todo mundo querer criar (e criar muito bem) naqueles espaços, acredito eu.

Enfim, a discussão às vezes parece filosófica, apenas uma briga de termos, mas quem vive esse dia a dia, sabe que não é. Talvez tenha chegado o momento em que a palavra "conteúdo" precise ser revista, pra sumir de vez ou adotar um novo status.

A certeza é que está na hora de olhar pra esse tipo de criação com a atenção e consideração devidas. Até porque, definitivamente, ela não é mais coisa de heavy users - e já se tornou tradicional há um certo tempo.

Né?

Carla Said, ACD da Publicis Brasil

Leia o texto anterior da seção "O Espaço é Seu", aqui.

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