Não precisa ser um assíduo seguidor dos acontecimentos no universo das grandes empresas de tecnologia para reconhecer Tristan Harris, cofundador e presidente do Center for Humane Technology. Basta ter assistido "O dilema das redes" (trailer aqui) para reconhecê-lo como um dos principais personagens do documentário, dentro e fora de cena.
Em sua palestra "Humane technology: Why the social dilemma is not destiny", ministrada no segundo dia do SxSW 2022, ele manteve o tom esperado de críticas ao uso da tecnologia pelas redes sociais.
Utilizando gráficos e emojis, Harris ressaltou a crescente lacuna entre a queda de nossa habilidade de lidar com complexidades, enquanto o mundo digital nos coloca cada vez mais diante de temas complexos. Entre eles, ataques cibernéticos; escalada nuclear; GPT-3 (Generative Pre-trained Transformer 3 - modelo de linguagem capaz de produzir texto semelhante ao humano) e mídia sintética, originária das fake news; risco financeiro global, Inteligência Artificial nas corridas armamentistas; e por aí vai.
Ele afirmou que somos movidos por "emoções paleolíticas, instituições medievais e tecnologias que se sentem 'deuses'". E para complementar, usou uma citação de Daniel Schmachtenberger, membro fundador do "The Consilience Project" (cujo objetivo é melhorar o senso público e o diálogo): “Não podemos ter o poder dos deuses sem a sabedoria, o amor e a prudência dos deuses”.
Para
Harris, a
tecnologia está minando a capacidade da humanidade de dar sentido ao que é complexo. E a sabedoria é a chave para fechar essa lacuna entre nossa exposição à assuntos complexos e nossa habilidade de lidar com eles. "Sabedoria é saber nossos limites, olhar para os sistemas e para a raiz do problema e entender a complexidade inter-conectada", diz.
Em um mundo
polarizado como o que vivemos, pessoas com
posições extremistas se manifestam mais do que pessoas moderadas. Aliás, vale ressaltar que isso acontece também
IRL (In Real Life), certo? Pessoas de opiniões moderadas
ponderam mais antes de se posicionar. A questão é que
tendo acesso a mais comentários extremistas nas redes sociais, começamos a acreditar que vozes extremas e estereótipos representam o mundo. E nos tornamos uma sociedade menos empática, aumentando nosso
gap de percepção, que
é a distância entre o que achamos que o “outro lado” pensa e o que o "outro lado" realmente pensa. Como disse a especialista em encontros e autora do livro
"The art of gathering",
Priya Parker, durante a abertura do festival, falta ouvir as necessidades das pessoas e de onde vêm os conflitos que elas geram (leia mais
aqui).
Ex-integrante da indústria de tecnologia, ele traçou um paralelo entre os
velhos paradigmas e o que propõe uma
tecnologia mais humana: você pode dar aos usuários
o que eles “
querem” ou
respeitar as vulnerabilidades humanas; pode defender que toda tecnologia tem
prós e contras ou
minimizar o que é nocivo; pode
maximizar a personalização ou criar um ambiente de
entendimento compartilhado; pode posicionar a tecnologia como
neutra ou apoiar a
equidade e a justiça; pode focar no "
quem somos nós para escolher?" ou conscientemente em
valores importantes; ficar obcecado com as
métricas ou ajudar pessoas a
prosperarem.
Harris falou da importância da
união para as transformações. Disse que quando começou seu trabalho de conscientização, há oito anos, não esperava ver
processos de investigações sobre os malefícios de redes sociais causados em crianças e adolescentes, por exemplo, ganhando as cortes e manchetes mundo afora, como mostrou com recortes de jornais durante sua apresentação. Gerando, inclusive,
prejuízos financeiros com quedas de ações. Lembrou do "
boicote" de grandes anunciantes ao
Facebook (leia anteriores sobre o assunto,
aqui, aqui, aqui, aqui e
aqui), que, no entanto,
não envolveu os pequenos negócios, principal fonte de renda da mídia. E disse que
denunciar más práticas é um caminho para a mudança.
Questionado pela plateia se a
descentralização da informação seria uma saída, ele chamou a atenção para o risco de se formar
novas bolhas de opiniões. Perguntado sobre uma
alternativa para a comunicação das marcas diante de um cenário que coloca o ambiente das redes sociais como nocivo à humanidade, ele respondeu:
"é difícil. Se você quer falar com as pessoas, não tem outro lugar para estar".
Como orientação prática e objetiva,
Tristan Harris convidou os presentes a participarem do
curso online Foundations of Humane Technology, que foi disponibilizado
gratuitamente (inscreva-se
aqui).
O
Clubeonline está no
SxSW 2022 por conta do patrocínio de
Africa; Arena; Beats; Chucky Jason; Live; Mutato; Netza&cossistema; New Vegas; 99; Publicis Brasil; Smiles e Soko.
Leia anteriores valiosas sobre o evento
aqui, aqui, aqui, aqui, aqui,
aqui e
aqui.